30/04/2017

A noite da má língua

Certa vez, enquanto limpava o pó, ouvi na rádio a Rita Blanco dizer que ser mãe a fez sentir-se mais pessoa. Nada a ver com o Fernando, entenda-se (a propósito, a feira do livro de Lisboa está aí, é tomar nota, arranca dia 1 de junho), mas limpava então o pó quando oiço a Rita Blanco dizer aquilo. Foi há mais de muito tempo, eram as minhas próprias filhas tão pequeninas que com certeza dormiam a sesta para andar eu na faxina, caso contrário mãe isto e mãe aquilo, não dava. A Rita Blanco era já, ao momento em que fui buscar o pano do pó ao armário pensando vou limpar o pó, era já, dizia, pessoa do meu agrado desde as noites da má língua, que eu nesse tempo via um nadinha de televisão. Mesmo com a voz estridente da Júlia Pinheiro, eu via. Por causa da Rita Blanco e dos outros, era o Rui Zink, e o Manuel Serrão, parece que estou a vê-lo, há que anos que foi, e ainda o Miguel Esteves Cardoso, de quem eu só gostava às vezes, ele era demasiado disruptivo para mim só que na altura não se sabia desta palavra disruptivo. Mas parei. O pano do pó não me caiu da mão, eu é que fiquei ali a ouvir o resto da conversa que vinha do rádio muito quietinha. Sintonizei-me, portanto, ainda mais com a Rita Blanco, ela nem sonha, sabe lá que eu existo (nem eu às vezes tenho a certeza de existir). Tornei a vê-la muito depois no maravilhoso filme denominado “A Gaiola Dourada” que levou a minha caçula, aí já a deitar corpinho crescido, a comentar à saída do cinema “Mãe, tu choravas que nem uma Margarida”. É Madalena, corrigi, mas então a rir.
Isto tudo porque me deu logo hoje para pensar ah e porque não um cineminha quando acabar o trabalho? Fui ver que tal de exibições e encontrei de novo a Rita Blanco anunciada num trailer, ora deixa cá ver, é Fátima. Fátima. Em 2017, maio a querer chegar lá o mais cedo possível, mas que maio tão cheio vai ser este nosso. Vi as salas, os horários disponíveis, variedade não falta e depois a data de estreia. Estreou há dois dias o Fátima. Pá... pensando bem, neste quase maio cem anos depois, não. As salas vão estar cheias de pipocas. Fechei a janela do computador onde consultava a informação, sacudi a ideia da cabeça, tornei ao trabalho e depois mais nada para dizer. Tirando isto: lá para o final do ano, maio passado, Fátima devolvida ao seu sossego, já de novo esquecida, e o filme em exibição numa sala perto de mim. Tipo a minha. É completamente pipocas-free.

(quem teve a ideia de concatenar a sétima arte com milho explodido e seu abominável ruído mastigatório inerente, fez muito muito mal – e agora ficarei, está bem, uns meses sem voltar a este tema, acho que sou capaz, vá)

25/04/2017

Aroma natural (pode ser cabras e ovelhas)

Recentemente apercebi-me de que ando numa fase das melhores, mais felizes de sempre. É bastante inadequado e estranho, foleiro e parolo, porém absolutamente verdade. Mas pelo sim pelo não, para testar a veracidade de tamanha felicidade e seus eventuais impactos no mundo exterior, aproveitei hoje o almoço com a Marina que me conhece desde antes de lermos as duas Os Maias ao mesmo tempo e disse-lhe assim: ando muito feliz, sabes? A ver se ela revirava os olhos ou me chamava maluca, como já tem acontecido (especialmente o chamar maluca) ou se atirava a cabeça para trás a rir. Mas não. Limitou-se a sorrir calmamente enquanto tudo em nosso redor deu continuidade à existência que já vinha tendo no minuto anterior e depois disse, ai sim? que bom! Portanto vamos continuar.

Tinha começado o dia pela reunião no edifício branco e luminoso que já visitara uma vez e ao entrar, bom dia. Bom dia soa sempre bem. A Doutora Maior com quem combinei a reunião está ali mesmo no corredor junto à copazinha e diz-me que vai tomar café, se eu quero café. Aceito, café aceito sempre. Enquanto corre na máquina o líquido quente e aromático (para não repetir café) a Doutora Outra com quem também vou reunir vem lá de dentro da sala contígua cumprimentar-me, como está. Estou bem (mas não lhe contei que ando assim tão feliz). Beijinho, beijinho. Eu não gosto muito de beijinho beijinho em contexto profissional, mas está enraizada a moda e prefiro segui-la abdicando do muito melhor e mais eficaz aperto de mão do que ser antipática, ainda por cima o cliente aqui são as Doutoras e a felizarda já sabemos que sou eu (para reforçar). E pergunta-me a Doutora Outra se conheço a Doutora Dentro da Sala que está ali a olhar para nós e eu não conheço. Então apresentou-nos e vem a Doutora Dentro da Sala beijinho beijinho, muito prazer. Mas eis que foi completamente diferente. A Doutora Dentro da Sala diz-me logo de repente assim: ai que bem que cheira! é o Escada? (e eu cá para mim, olha a vantagem do beijinho beijinho)
- Não, não é o Escada.
- Deve ser o aroma natural – diz a Doutora Maior que ainda está aqui a beber o seu café e eu o meu (com licença) e se calhar não achou muito apropriada a conversa, mas informou-me prontamente que a Doutora Dentro da Sala é meio francesa e bastante espontânea.
- E eu gosto de pessoas espontâneas e francesas mas este não é o meu aroma natural.
Depois enfiei o nariz na xícara para me entreter com o café e me subtrair a dizer que perfume é o meu, enquanto olho através da janela para a erva lá fora, que está alta e a pedir para ser cortada, e me ocorre uma ideia do tipo startup: um negócio de aluguer de cabras e ovelhas para temporadas em jardins como este onde fariam de cortadores de erva naturais. Serão silenciosas (tirando um ou outro bééé), ecológicas, decorativas, transportam a erva cortada sozinhas e essas sim, seguramente, com aroma natural.

Sei. É da felicidade. E a reunião correu lindamente.

20/04/2017

Postas de pescada (um post melhorzinho)

Lá fui dar àquele balcão do supermercado onde se passam temporadas com frio. O sargo anunciado selvagem numa tabuletazinha espetada no gelo limítrofe, mas foi para a pescada que me virei, uma inteira, se faz favor, depois partida em postas assim - aos meus dedos impus configuração de largura de postas, umas senhoras postas.
- Para cozer?
Para cozer. Engraço muito com os laivos nacarados, acho que é nacarados, que o teor de ferro confere à superfície do naco branquinho, depois, já no prato. É só inclinar a cabeça e vê-se perfeitamente, são azuis, são verdes, são lilases. Mas aguardo ao balcão desta temporada ao frio bastante bem vestida. São duas camisolas de gola alta, ó se faz favor, uma sobre a outra e depois o sobretudo cinzento ao qual recentemente preguei um botão caduco. Normalmente é ai que frio, ai que frio, mas hoje pude observar os peixinhos com vagar. A minha filha vinha distrair-me a espaços perguntando que mais vai ser, mãe, ela não tão bem vestida quanto eu, nem por sombras, ia abastecendo o carrinho de compras que me secundava, os ovos, uma garrafa de vinho branco, o pedaço de abóbora que a esta hora já virou sopa, o louro, os iogurtes. É algures entre os ovos e a abóbora que torno a olhar a minha pescada inteira ainda não partida, porém já sem cabeça, e a vejo toda abandonada por baixo da torneira móvel extensível que lava balcões de tripas e o chão e as raparigas que trabalham o peixe se for preciso mas não foi, portanto pergunto, então a minha pescada? Estou meio a querer zangar-me daquele abandono, mas só meio por causa do agasalho que me mantém quente a paciência, admirada de ver a moça a descascar as escamas doutro bicho que até deita corpo de pescada mas eu daqui não tenho a certeza. Então a minha pescada?, repito, ao que ela diz já vai, já vai e a cigana que está aqui ao meu lado no balcão chega-se mais perto e explica-me que eu estava distraída a conversar, e estava, sobre os ovos, e não vira que a primeira pescada não estava boa, que estava moída. Interessei-me. Moída?! Moída, querida. A cigana chamou-me querida. A rapariga do outro lado do balcão, que largou por momentos a pescada segunda, sempre era pescada o bicho supracitado, vem então ilustrar a conversa com a pescada primeira nos braços, mas já sabemos que sem cabeça, vê, está moída. Pressiona com os dedos o lombo descoberto e diz, não podemos dar o peixe assim aos clientes.

Quando a pescada segunda, em postas, foi colocada suavemente no tapete rolante da caixa de pagamento, perguntam-me se tenho cartão de cliente.
- Ter tenho, mas está em casa. Vim direta do aeroporto, aterrei mesmo há bocadinho.

E foi muito o que disse; explicar que esta minha filha já me vai buscar de carro onde eu precisar, que o sobretudo e as camisolas de gola alta deram um jeitão à beira do pescado para que não me zangasse sem razão e que estas postas, minha senhora, podem muito bem ir dar em post é que já não fiz.

14/04/2017

Amêndoa amarga

Não quero ver a palavra mãe na mesma frase que a palavra bomba. Não se pertencem. Não há mães de bombas. As mães são alimento, são vida, são amor. Na maioria das vezes, felizmente. Se eu mandasse nesses jornais abolia a palavra mãe dessa frase. Não houve, durante toda a minha vida, outro presidente dos estados unidos (ainda se diz unidos?) da américa que tivesse sido capaz de chegar ao meu coração e nele depositar um tanque de raiva, uma quantidade q.b. de ódio e quilos de medo.

Além de me levar a pensar que a mulher dele deve precisar de muitas caixas de comprimidos para o enjoo. Vendas nos olhos, molas no nariz e tampões nos ouvidos. Repelente asqueroso.

13/04/2017

O meu Amarante era Duque

Também eu tive um cão fiel na minha infância. Infância, infância: a última vez que me lembro de brincar com o Duque sei que tinha quatro anos. Eu andava sempre a pensar agora tenho três anos, agora tenho quatro, etc. Queria crescer e ia contando o tempo que, naquela altura, arrastava-se lento (agora é ao contrário). Então o Duque era um Pastor Alemão todo preto no qual o meu pai confiava muito, parece que falava com o cão sem falar e o cão percebia tudo. Mas quando um dia, corria eu pela casa ainda de fraldas e entrei na cozinha a alta (bem… não muito) velocidade, o Duque se levantou de um salto lá do repouso aos pés do dono, correu, ultrapassou-me na cozinha e depois atirou-me ao chão com um empurrão de focinho na minha barriga, o meu pai não percebeu logo. Levantou-se e foi averiguar dos intentos do cão, mas para quê tanta violência, o que andas a fazer, seu maluco, eu a chorar no chão em cima das fraldas, e então percebeu que o Duque sabia o que ele, meu pai, houvera esquecido. O forno estava ligado a cozinhar qualquer coisa e eu levava talvez interesse na corrida a velocidade, vá, moderada, de ir experimentar o vidro do forno com as mãos ou o nariz, fito que o Duque telepaticamente captou e, por ter discordado, foi interromper-me a corrida deitando-me ao chão, como já foi dito.

Mas já andava eu livre de fraldas há muito, tinha os tais quatro anos e estávamos na casa de férias dos meus avós. O Duque tinha uma casota só dele, onde eu calculava que à noite ele dormia.
- Duque, vamos brincar às casinhas, faz de conta que eu também moro aí!
Mas só cabia lá um de nós de cada vez, e se fosse eu era agachada e quieta que cabia, correr nesta casa não se consegue. Só que para além de exígua, a casinha do Duque cheirava um bocado mal a cão e eu não aguentei o cheiro por muito tempo, portanto mudei a brincadeira de “às casinhas” para “aos cavalos” e o Duque não se opôs (aparentemente).
- Duque, tu és o cavalo.
Montei no dorso do Duque, que ele era mesmo bom para meu cavalo, e disse, anda cavalinho, para ele perceber os papeis. Mas ele não percebeu nada. O Duque sentou-se mal me sentiu em cima dele e eu escorreguei pelo dorso abaixo, apeada à força.
- Duque! Põe-te em pé! Tu és o cavalo!
Indignava-me ele ter brincado tão bem às casinhas, sermos tão amigos eu e ele, e agora não querer brincar de cavalo, um cão destes tão lindo!, eu achava-o lindo e o meu pai dizia que ele era lindo porque era todo preto e não preto e castanho como é habitual nesta raça. Quando o Duque se pôs em pé, eu montei-o outra vez, ele outra vez se sentou e eu tzzzz pelo Duque abaixo. Pá, ó Duque, vá lááá! Mas nada, ele não queria brincar de cavalo.
Tentei apanhá-lo noutras horas, noutros dias, apanhava-o de costas, distraído, eu devagarinho alçava a perna, ele percebia tão bem o meu pai também tinha de perceber-me a mim, era para brincar de cavalo e correr comigo às costas, anda cavalinho, mas ele sentava-se sempre e eu sempre escorregava. O Duque nunca quis ser cavalo.

É mesmo como diz a Teresa: é um cão fiel o que temos no jardim da nossa infância.

08/04/2017

Orquídeas morrem a toda a gente

Lavei os dois potes de pedra do terraço, que acolheram todo o inverno com a concavidade que os caracteriza, e ainda guardaram algumas folhas outonais que os escolheram e neles quiseram apodrecer. Podia também dizer-se uma poesia aqui, mas nesse caso estaríamos no blogue errado. No fundo, os potes de pedra continuam à espera de uma planta que lhes não morra dentro completamente. Eu sou de poucas artes no que respeita a exercer o amor pelas plantas, isto é, a tratar delas com sucesso garantido. Já me morreram hortenses, orquídeas (mas essas morrem a toda a gente), flores diversas de todas as cores desde que em vaso, gerânios muito lindos e coentros. Lembro-me até de que estava a experimentar na marquise de Lisboa onde vivia à época, uns enxertos estufados em sacos de plástico de uma planta que me encantava cujo nome perdi, mas entretanto nasceu-me uma filha e os enxertos pereceram antes de ela chegar às sopas. Houve que interromper, portanto, os amores às plantas para tratar de um banho, de um bolsado, de uma ida ao hospital, do pediatra ou, até, do IRS. E os potes não foi só lavar, os potes foi desentupir o buraquinho do fundo cheio das folhas apodrecidas já mencionadas, para amanhã, atenção. Amanhã dar início a mais uma tentativa de me lançar em jardinagem caseira. Enchê-los-ei de terra que estava em promoção no supermercado mas só comprando vinte quilos, que arrastei para casa, e lá plantarei um cato muito bonito em cada um. Cato agora é sem c.
Podia tirar antes os vinte quilos do solo aqui do monte beirão, não podia? Podia, mas não me lembrei.

(este post é capaz de ter amanhã atualização com os catos plantados a deitar para a serra, ao menos bonitos eles, caramba, eles são)

***
segue-se a atualização prevista do dia seguinte, mas agora não tenho a certeza de isto serem catos, que picar eles não picam.


04/04/2017

P'trúgal Cuqui

Finalmente encontrei o tipo de letra que eu queria. Já tinha procurado umas vezes, não muitas. E é assim grandão porquê, porque eu entretanto, nestes quatro anos de blogue, já engordei quatro quilos não sei como porque não como (olha que giro) assim tanto, e os meus olhos empobreceram bastante, para não falar no esquerdo que tem chorado muito ao vento. Mas nada a temer, estou envelhecendo com alegria, e não tenciono plastificar-me nadinha.

Portanto vou usar desta nova letra tão boa para contar uma história que foi antes do blogue, dos quatro quilos e disto dos olhos, etc., e para se perceber aquele título ali.

Eu estava anfitriã de dois cidadãos chineses no meu contexto de trabalho. Um cidadão chinês de cabelo todo espetado que parecia ter dez anos de idade mas tinha uns vinte e dois e outro cidadão chinês, esse engenheiro, que já ia nos trinta mas sombra de barba nenhuma. Sabendo eu que os cidadãos chineses andavam a comer porcarias ao jantar nas lojas de comida rápida que apanhavam por aí e sendo eu um bocado maternal, pensei, coitadinhos vou convidá-los para jantar cá em casa num sábado e convidei. Usei do meu inglês o mais bem articulado possível, como tinha que ser, e eles muitas exclamações fizeram quando entenderam o convite. O cidadão chinês de cabelo espetado saca do seu dispositivo achatado do bolso das calças, que era também um dicionário, e põe a palavra chinesa que foi traduzida para "bother" querendo dizer que me iriam incomodar. Passando este na na na da cerimónia, consegui que eles aceitassem e para enriquecer a situação e não ser apenas eu e duas menininhas de cabelos encaracolados, pedi à minha irmã mais velha para vir juntar-se a nós, com seu marido e filhos, dois rapazes dentro da faixa etária das minhas. Não me lembro o que cozinhei, só me lembro que a minha irmã não aprovou a minha escolha, mas sendo ela uma dona de casa exímia e eu uma dona de casa esforçada, é de esperar. Servi o vinho que era tinto e, antes de começarmos a refeição erguemos os copos, os cidadãos chineses imitaram-nos, dissemos tipo Cheers! e nós um golo e pousamos os copos e eles um golo e todos os golos de seguida até ao fim, esvaziam os copos de uma vez. Ninguém se riu, nem os meninos, que olhavam muito sérios. Comemos então a tal refeição que a minha irmã não aprovou (ela queria uma mão de vaca, uma dobrada, um cozido à portuguesa, mas eu sei lá fazer essas coisas) e no final, eles já com segundo copo de vinho servido e agora tomado aos golinhos (aprenderam), veio a sobremesa. Eu tinha feito uma tarte de maçã com massa folhada que recebeu muitos aaaaa's por parte dos meus convidados chineses, ao que lhes disse, satisfeita com a aceitação, que não era difícil de fazer. Não acreditaram que tinha sido eu a fazer a tarte. Fui. Arralhááá! Fui, fui. Alhálhááá! A sério que fui eu. Aaaalhá háá!
Mau. Levantei-me e fui buscar o livro de receitas de onde tirei esta, folheei-o à frente dos cidadãos chineses até encontrar a fotografia da mesma tarte que estamos a comer, mas eis que pelo caminho, a páginas tantas literalmente, eles os dois ao mesmo tempo lançam um grande ralháááá!!!! e apontam com muita veemência para o livro. Voltei folha a folha para trás, mais devagar, até ficar à vista a página que exibia o nosso, o único, o suculento e delicioso pastel de nata. Os dois chineses gritam mais ou menos em uníssono "P'trúgal Cuqui!!!" (eles queriam dizer uma coisa do tipo "Cookie from Portugal" ou isso). Jesus. O que se seguiu foi o meu cunhado a dizer-lhes imediatamente que sim, que é um bolo muito português, que aliás estando nós a uns quilómetros da fábrica, da genuína, autêntica, centenária, ninguém sabe a receita do original, o verdadeiro, ninguém-sabe-a-receita, ele frisou, podíamos ir lá, ainda deve estar aberto, diz o Mário olhando para o relógio e olhando para mim a obter consentimento, claro que sim, vamos já lá (eu mentalmente a preparar-me para a fila que não desmancha nunca naquela porta). Voltaram-se um para o outro e iniciaram a discussão para decidirem se aceitavam ou não mais este convite, nós suspensos a aguardar o desenlace, o fumo branco, a conclusão.
Foram uns minutos de
- Alhááa!!!!
- Arralhááá!!
- Lhálhalhááá!!!
E vocábulos do género, mas muitos, que aquilo se durou.

Quando finalmente se calam, vira-se o mais velho para mim e diz:

- No need, no need, many P'trúgal Cuqui in China, many many.

(claro que desde esse dia, na minha família, passou o pastelinho de nata a chamar-se P'trúgal Cuqui)