Há demasiadas terças-feiras que eu vinha achando ela triste.
Não ficava falando o caminho todo, não fazia perguntas nem vinha dando resposta
a ela mesma, não contava do treino, não dava opinião, não reclamava do
treinador, nada. Na última terça-feira, eu quebrei o silêncio e disse
- Joana, tu tens andado triste, o que foi?
- Eu?!
- Sim, tu.
Joana é uma das jogadoras de vóleibol que eu entrego em casa
toda terça-feira à noite depois do treino (se esta postagem estiver parecendo de terras de vera cruz,
está certo). Minha filha Saminhas, que (óbvio) também vem no carro, ficou
me secundando
- É verdade, Joana, tu andas triste.
- Ah… é que eu estou a jogar mal, mesmo mal. E fico irritada
comigo mesma...
Hoje, terça-feira, Joana vinha correndo e saltando, sim, ela é de correr e saltar, até chegar em meu carro. Eu desligo a Antena dois para não
perturbar o papo que vai rolar, ela entra e boa noite!!!!! - óbvio que a nuvem
finalmente se dissipou.
- Olá Joana, vejo que o treino hoje correu melhor…
- Correu!! Falei com o treinador e pedi-lhe para mudar de posição
no campo. Ele ficou admirado com o meu pedido, mas diz que talvez dê para mudar!!
As outras meninas também já sentaram, para além de Saminhas vem a Bárbara junto com ela, apertaram os cintos e eu faço minha parte: pé na tábua (mas
óbvio que pouco).
- Então foi isso que te pôs de novo a Joana que conhecemos?
- Acho que não tanto... Eu já ia assim para o treino… Foi
hoje no ginásio – Joana trabalha num ginásio depois das aulas – a minha
patroa pediu-me para pôr música a tocar, uma música que eu gosto, e eu pus,
adorei!! Fiquei a cantar e a dançar, adoro música brasileira! Foi tão bommmm!!!
E eu, que não oiço só a Antena dois e gosto desta miúda mas
é muito, ligo de novo o rádio do carro e seleciono o CD que está inserido*, coloco
o volume bem no máximo e digo, ou talvez eu grito:
- Vê lá se gostas desta!
O caminho por essa cidade afora foi com as meninas dançando de braços no ar, eu apenas cantando bem alto, meus braços vão
dirigindo. Então a Joana grita
- Não sabia que a mãe da Saminhas também ouvia esta música, pensava
que era só clássica!!
Estamos paradas no semáforo, lembro que a música está bem
alta e as meninas dançando de braços no ar e cantando e então olho o condutor parado do meu lado esquerdo, o
único a esta hora (que já 'tá tarde), quem sabe ele está se incomodando
com a nossa barulheira, apesar de termos os vidros subidos. O condutor olha em
frente, ‘tá nem aí, quietinho, 'tá bem na dele e eu vejo que… olha! Eu conheço
ele!! É tão-só o presidente de um dos meus clientes!… No entusiasmo deste som, tenho o impulso de baixar
o meu vidro, dar uma apitinha na buzina, acenar, dizer olá…..
Mas depois, não. Melhor não.
*
(quando, daí a três músicas mais, a Joana saiu do carro, disse "que pena a viagem ser tão curta")