Quando entro na sala para comparecer à assembleia de condóminos do prédio, encontro duas vizinhas a acabar de desmantelar a gigante árvore de Natal, disponibilizada pelo vizinho das luvas brancas, já conhecido deste blogue, que este ano ostentou a entrada do edifício (a árvore). Fiquei então a olhar para elas dando ordens rigorosas, este ramo não está bem, aquele não-sei-quê, ponham aqui façam para ali, com voz de comando e tudo. Não, mentira. Pousei mas foi as chaves e o computador que levava para aceder aos documentos da assembleia de condóminos e ajudei-as na tarefa, evidentemente. Uns poucos de ramos de árvore de Natal espalmados depois entrou uma outra vizinha, e passamos a quatro. Esta última a mais faladora, aliás muito faladora, que não precisou de ajudar em nada, estava já a árvore plástica vencida, em partes, jazendo na sua caixa esventrada e desempenhando na perfeição (são muitos anos a virar frangos) o seu papel muito conhecido de árvore-de-Natal-que-não-cabe-nunca-de-regresso-na-caixa-de-onde-veio (numa sala perto de si), isto por mais mãos que a espalmem, e contudo todos os nossos males fossem mas é destes. Adiante: tirando eu, ali todas se chamam Ana. A Ana Faladora avança imediatamente com informações minuciosas sobre o seu Natal enquanto não chega mais ninguém para a assembleia de condóminos daqui em diante AC para o post ainda sair hoje. Eu, que de faladora tenho uma grande fama mas nem por sombras o proveito, fui ouvindo. As restantes Anas contribuíram aqui e ali com informações próprias, também de teor natalício. No entanto estas contribuições estavam a ser completamente atropeladas pela conversa ininterrupta de Ana Faladora (AF, pelas mesmas razões). Eu continuo ouvindo. Na verdade considero pouco provável que alguma das Anas presentes tenha imensa vontade de saber detalhes do meu Natal. De repente, no discorrer da descrição, diz AF que embrulhou uns cento e sessenta presentes. Eh lá, vamos confirmar.
- Quantos disse? Cento e sessenta? - quebro agora o meu lindo silêncio.
- Cen-to e se-ssen-ta, ouviu bem! - AF parece contente.
(Eu sei que a divisão de sílabas está defeituosa no sessenta.)
Com certeza abri mais os meus olhos para ouvir aquilo como deve ser.
- Sim, sim, foram vinte e cinco presentes que dei a cada pessoa! - AF acrescenta, não fosse eu estar incrédula.
- Vinte e cinco a cada pessoa!?!? - estou tão entretida a confirmar os números de AF que não sei o que estão a fazer as outras Anas, se soubesse dizia. Provavelmente mais pessoas com outros nomes estão chegando agora à sala para a AC e conversam com as outras Anas.
- Para mim, Natal é assim mesmo, com muitos presentes! - AF remata, justificando as quantidades.
Deixei passar o detalhe de cento e sessenta não ser múltiplo de vinte e cinco e mais um ou dois vizinhos que iam - confirma-se - chegando, boa noite, com licença, uma vez que eu estava, se virmos bem, meio na entrada onde se desenrola este post.
Um post que parece mentira e até é. Mas só no ponto supraconfessado. Incrível.