Com esta mania de ser independente em tudo, incluí no pacote das minhas habilidades verificar o ar dos pneus do carro, antes de uma longa viagem.
Faço-o há décadas e em todos os carros que tive até hoje - não foram muitos, mas foram alguns - fui bem sucedida no processo. Tão satisfeita isto me fazia sentir, que devo ter partilhado o facto com a Marina.
Nesse Verão combinámos ir de férias com os respectivos filhos, num total de quatro, connosco seis.
Destino, Algarve. Suficientemente longe para merecer a verificação dos pneus.
A minha amiga, muito mais realista do que eu e ciente das dificuldades da vida, não se tinha aventurado nesta caminhada de tratar o carro por tu.
Eu assegurei-lhe que a minha vasta experiência com os pneus e a respectiva pressão do ar era perfeita para, quando parássemos na estação de serviço de Palmela, a coisa fazer-se sem novidade. Todo este discurso foi acompanhado de uma ponta de orgulho deste lado.
É altura de dizer que desenvolvi um jeitinho de mão que aplicava com segurança, no momento de retirar a ponteira da manga abastecedora do pipo do pneu e não deixar ssssssair muito ar. Aquele sibilar enervava-me. Será que a pressão não baixou?
Palmela à vista, fizemos a paragem combinada, miudagem aos xixis.
Atirei-me primeiro ao meu carro, para transmitir confiança à minha amiga. Quatro pneus mais tarde, confirmada a minha destreza, passei ao carro dela.
No primeiro pneu não me aventurei com toda a garra no jeito de mão do momento final. Foi só ao de leve. Ssss.
No segundo pneu, estabelecida a confiança com o VW Passat novinho em folha da minha amiga, cá vai disto. Jeitinho final. Sssssssssssss. Bolas, ainda saíu ar.
Terceiro pneu, vou aprimorar. Sssssssssssssssssssssssss.
Ssssssssssssssssssssss???
- "Ó mãe........", diz-me a Sofia, "......o carro está a descer".
- "Mmm? a descer?"
Já não me aproximei do quarto pneu, a Marina tirou-me a mangueira assassina das mãos. Os dois pneus de trás estavam completamente vazios, barrigas estendidas no pavimento a antecipar o banho de sol que só no Algarve deveria acontecer.
Totalmente confusa, a balbuciar desculpas e com a garganta colada, eu tentava acreditar no que via. Sentia-me perdida e não compreendia porque o Passat estava contra mim.
Com as pernas a tremer, dirigi-me ao balcão de atendimento da estação de serviço. Mas o que fiz eu de errado?
- "Acabei de furar dois pneus ao carro da minha amiga" - disse eu à empregada, que me olhou com espanto misturado com medo e assim ficou cinco segundos enquanto processava a informação.
- "Dois?..." - repetiu ela, exibindo dois dedos da mão direita a ilustrar a quantidade.
O salvamento chegou depressa e afinal os pneus não estavam furados. Os pipos do Passat eram feitos de uma liga frágil, tecnologia recente, explicou o mecânico de serviço que nos salvou as férias (denotei um certo, ligeiro, divertido sorriso no seu rosto que prefiro não tentar interpretar).
A tal liga de que eram feitos os pipinhos, excelente para comunicar com o computador de bordo do automóvel, não era à prova de jeitinhos de mão. Esqueceram-se dessa parte, lá na VW. Sssssssssssss.
As férias foram boas e a Marina felizmente continua minha amiga.
Mas as minhas mãos não mais deram jeitinhos em pneus de qualquer carro.
Sem comentários:
Enviar um comentário