07/08/2013

Cremoso com cheiro a limão


As férias num barco como este exigem uma visita ao supermercado, de vez em quando, para abastecer de mantimentos.

Foi o caso de hoje.

Planeámos a jornada por forma a fazermos a paragem na cidadezinha holandesa de Oldeboorn. Esta pequena cidade, devo acrescentar, para além de ter uma torre inclinada e postais à venda nas lojinhas de rua com fotografias da torre, tem também uma loja para produtos de pesca onde comprei há dois anos as minhas botas de borracha made in Portugal.

Mas voltemos a hoje.

Chovia que se fartava, facto que não nos deteve dos nossos intentos. É que nos faltava um ingrediente importantíssimo para o jantar supimpa que tencionávamos cozinhar a bordo.

Atracámos o barco à chuva, processo que deixa as minhas mãos em mau estado. Os cabos ficam ásperos e encharcados, mas há que laçá-los, dar os nós, não vá o barco ter ideias de fugir.

Caminhámos em passos apressados até ao supermercado, que fica a meia dúzia de quarteirões da zona onde parámos.

Tínhamos uma lista de apenas sete artigos, entre os quais um produto de limpeza daqueles cremosos que cheiram a limão. Para além, claro, do ingrediente maravilhoso para o nosso jantar, ao qual já fiz referência e que agora revelo: bami.

Entrámos no supermercado, pingámos o chão, baixámos os capuzes, notei que a disposição das prateleiras estava diferente. Afinal, já há dois anos que não vinha aqui.

A recolha dos artigos da nossa lista para dentro do cesto de compras decorreu sem ocorrência merecedora de registo. Ainda juntei chá verde da Indonésia aos sete artigos da lista, por causa da chuva. É bom beber chá a fumegar quando estamos encharcados. Mesmo em Agosto.

Ao chegarmos à caixa para pagamento, o Erik depositou todos os oito produtos no tapete de borracha preta, para poderem ser lidos pelo leitor de código de barras e registados para pagamento.

Eu cheguei-me à frente, para lá da célula de registo óptico. Preparei-me para receber as nossas compras, com o saco de plástico aberto. Um trabalho de equipa bem encadeado, o Erik e eu.

O caixa do supermercado é um jovem que aparenta ter uns dezasseis anos, tipicamente um dos muitos casos de empregos que os estudantes arranjam no verão.

O jovem passou o primeiro artigo, que eu guardei no saco. E o segundo também.

O movimento brusco que o tapete de borracha preta fez, ao arrancar a sua marcha, pregou uma rasteira à garrafa de detergente cremoso com cheiro a limão, apanhando-a desprevenida. A garrafa caíu, a tampa abriu-se e o detergente castigou o tapete com umas gordas manchas amareladas. A elas, acrescentou-se um riozinho da mesma cor quando o rapaz da caixa removeu apressadamente a garrafa, apertando-a com mais força do que devia. É da tenra idade, penso eu.

Peguei na embalagem acidentada e meti-a no saco, bem fechada, não sem antes me certificar de que tinha ouvido o bip-bip a anunciar que o registo estava feito.

Tinha-se aproximado o encarregado, que andava ali por perto, para ajudar o moço munindo-o rapidamente de pano e spray de limpeza, a aplicar ao tapete, que já cheirava a limão.

O Erik, ao ver a atrapalhação do caixa, interveio para ajudar. Pegou em dois ou três dos artigos que ainda esperavam vez em cima do tapete, e que estavam perigosamente perto do detergente entornado, para que o rapaz pudesse executar os movimentos de limpeza em espaço livre.

No entanto, a boa vontade do Erik fez com que a célula óptica detectora da presença de artigos anunciasse a ausência destes e o sistema desse ordens ao tapete para rolar.

Antes que o rapaz pudesse iniciar a operação, de pano erguido numa mão e spray de limpeza na outra, o detergente entornado desapareceu da nossa vista.

E depois o tapete parou.

Com as mãos ocupadas com os artigos removidos, quis o Erik pousá-los para poder retirar outros e fazer o tapete rolar outra vez, quiçá a mancha cremosa apareceria na outra ponta a deixar-se finalmente limpar.

O melhor local que viu para os pousar foi aquele que daria o resultado mais eficaz: dentro do saco de compras que eu segurava enquanto observava a situação.

Para ajudar o rapaz.

Que entretanto exclamou qualquer coisa que eu não entendi, a apontar para os artigos que o Erik colocava dentro do saco sem terem sido registados para pagamento. O tapete voltou a rolar.

Eu comecei a retirá-los do saco, mas o rápido Erik ainda meteu mais um ou dois lá dentro. A ver se o tapete rola mais um pouco e o rapaz o pode limpar...


No fim, assegurámos que tudo era de novo verificado e registado, pagámos a conta sem que faltasse nada, pedimos desculpas mais algumas vezes e saímos para a chuva.

Enquanto arrumei as compras, ainda a rir, na nossa pequena mas funcional cozinha a bordo, o Erik limpou os vidros da nossa viatura flutuante, embaciados pelo tempo húmido, soltou as amarras e pôs-nos em marcha.

Já em andamento, tomámos o chá verde da Indonésia que tem florzinhas rosa muito bonitas.

E mais tarde, ao jantar, saboreámos a deliciosa refeição asiática que o Erik preparou, a condizer.

Não com o chá, mas com o vinho tinto da região de Setúbal que também se vende por aqui.

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