A toalha de mesa de algodão que herdei dos meus avós, de um
algodão grosso, muito branco, faz uns desenhos abstratos que são tão difíceis
de interpretar como fáceis de encontrar em superfícies ornamentadas em casas de
avós em geral. Cedo aprendi a consentir identidade a tais arabescos de padrão repetido, uma identidade aguçada pela familiaridade da sua presença tão constante, como uma história que se lê repetidamente a uma criança. Aos desenhos em padrão repetido e abstrato da toalha que herdei dos meus avós aceitei-os como se aceita por exemplo que as laranjas são cor de laranja. A toalha tem
franjas que fazem um acabamento suave dos seus limites a toda a volta, como se lamentasse não continuar, não ser ainda maior, e está rota em dois lugares. As
franjas distribuem-se em grupinhos formados com um nó feito às fibras junto da
base, que caem, estando posta a mesa, supostamente. Apesar dos dois buracos e de estas fibras que
formam as franjas já terem sofrido, em certos pontos e naturalmente, o processo
de soldadura por contacto, lá entre elas, inviabilizando ideias de as endireitar e muito menos pentear, que
é de tanto viverem juntas em gavetas e gavetas e gavetas quando fora de
serviço, são umas boas sete décadas entre serviço e gavetas, e está quase este parágrafo
a fechar, apesar disto tudo acima exposto, queria eu dizer, não tenho a mínima intenção de
alhear a toalha. Trata-se completamente de património e posso dizer histórico,
que o blogue é meu. Além disso constitui um desafio, vamos ver. Está rota em dois
lugares, como já foi dito. Um deles o meu, lógico e fácil: ponho-lhe o
prato em cima e vigio a situação para que não haja revelações da rotura. O
outro lugar é mais arriscado. Também leva com um prato em cima da cedência de tecido ao espaço, mas a
vigilância aí não está sob o meu controlo, de forma que das duas uma, ou nada
acontece e o jantar estava tão bom!, ou
o buraco é encontrado por um comensal de prato no ar e olha, a toalha está rota aqui! Esta é a parte em que levanto então também o meu, com licença, e aqui também!
E depois conto esta história toda à mesa. À mesa e aos comensais.
Quase tão velho como a toalha está este ano que acaba aqui com a mesa posta, e cheia, e espero que com os corações também cheios: de amor, de esperança, de entusiasmo. Um ano novo com muitos sucessos e
momentos felizes é o que desejo a todos os que me dão o prazer da sua companhia
neste blogue e que talvez não imaginem o quão importantes são para mim.