Dizem que é para ter autoconfiança. Eu não vou dissertar o
que há a dissertar sobre os outros dizerem: tenha autoconfiança. Do tipo conselho.
A intenção é boa, claro, de modo que vá, não dissertando nada, faço agulha
uns graus à minha esquerda, para onde ela está sentada. Estamos na sessão do
curso que andamos a fazer, ela, eu e mais pessoas, e estamos na pior sessão de
formação a que já me foi dado assistir. Tão má que achei, à cabeça, que era
aquilo a brincar.
A minha colega, esta que está à minha esquerda, mais assertiva do que eu que já
estou a entediar-me e a indignar-me com a sessão medíocre e hesito entre dizer já ou dizer
depois que a sessão é medíocre, está segurando com ambas as mãos muito bem
arranjadas o seu telefone esperto a uns centímetros – acho que uns dez
centímetros – acima da mesa de fórmica da fria sala de formação. Vai pondo a escrita
de mensagens em dia: entre mensagens rápidas, o seu dedo corre a lista geral, a
cada linha uma fotografia associada, ou então aquele desenho padrão de recorte de cabeça
sem cabelo para quem foto não tem, vejo pelo canto do olho isto e o correr de
mensagens, mas enfim, tento espremer a sessão a ver se dali tiro alguma coisa, lembro-me de quanto paguei para aqui estar, e concentro-me na muito pobre formadora. Mas de repente a minha colega espirra violentamente, o telefone cai em cima da mesa catapabum! e eu dou um salto. Este ar condicionado
é realmente muito forte, também eu teria frio não fosse estar dentro do casaco.
- Ai… desculpa – na sequência do meu salto.
- Não faz mal, saúde. – e olho de novo para o telefone, que já regressou
às suas mãos, acima do nível da mesa, a lista de mensagens agora quietinha. E então, sem querer, os meus olhos leem o nome que está junto à
fotografia de homem jovem, óculos escuros, sorridente, céu azul por trás, é a
fotografia com mais ocorrências na lista, aliás quase todas as ocorrências da
lista: “Mor”.
Desviei os olhos num instante para não prolongar a invasão ainda
que não intencional e antes que um sorriso me denunciasse o enternecimento que deveras senti. "Mor”.
Tanto, que deixei para dizer da porcaria da sessão depois.
(esta minha colega é
das pessoas com mais entusiasmo, espírito são e atitude construtiva que me foi
dado conhecer nos últimos tempos)
sessões e autoconfiança...sou muito cética, quer dizer, não duvido da autoconfiança, quem a tem chama-lhe sua. o que duvido é das sesões que a promovem. duvido disso, e do serviço televendas. e mais uma, ou outras duas coisas, mais ou menos.
ResponderEliminarbom feriado, Susana.
um beijinho,
Mia
Não era bem uma sessão de autoconfiança, mas de facto houve que muito labutar para separar a palha do que é bom. Enchem-se muitos chouriços desnecessariamente.
EliminarE depois ficas tu e fico eu a duvidar dessas coisas e doutras. :-)
Um beijinho, Mia, bom feriado também para ti.
é decerto jovem essa colega; as namoradas dos meus filhos também lhes chamam mor por sms. E quem sabe, é assim que são nomeados na lista de contactos.
ResponderEliminarTambém não acredito em autoconfiança às colheres. Seremos sempre autoconfiantes numas coisas e nem tanto noutras. Se essas outras são a maior parte, se calha, habituamo-nos a viver connosco tal qual e sem sessões.
A minha colega é jovem, sim, mas já passou dos 30.
EliminarAutoconfiança e outras coisas metidas às colheres e a martelo (acrescento eu) dentro de pacotes brilhantes com bonitos laços dourados que inebriam quem olha e distraem de pensar se de facto dentro haverá algo a que se possa chamar verdadeiramente de conteúdo. Vivemos numa sociedade que promove demasiado o embrulho e de menos o conteúdo. Isto quanto a mim, evidentemente.
A Susana está a oferecer um post fofinho e a mim apetece-me ir dizer olá à Susana, mas depois comecei a sentir-me a bruxa má de uma história por não conseguir enternecer-me com isso do "Mor", é que é uma das coisas que, pronto, não me enternece, é assim uma das minhas embirrações, e foi então quando já estava a pensar que ia embora do post e dizia olá num outro dia, que não queria macular um post fofinho, que chegou o meu momento de enternecimento, é que "pessoas com entusiasmo, espírito são e atitude construtiva" enternecem-me, e fazem uma falta, resultado, até me esqueci daquilo do "Mor".
ResponderEliminarOlá, Susana!
Nós embirramos com o "Mor" porque não gostamos de ver o "Amor" amputado e usado a torto e a direito. Daqui a pouco já nem sabe quem usa "Mor" que na verdade está a usar "Amor", tal como quem usa "lol" não faz ideia do que significa "lol" e usa-o com variantes "looool". Muito pindérico.
EliminarMas esta rapariga, sendo como é, digamos que eleva essa prática do "Mor" a um nível maior. Eu enterneci-me mesmo.
Olá, minha querida Cláudia. :-)
gostei do mor... é tipo um combinado de amor com more, um meio caminho... também gostei do post fofinho, gosto do saltitar de assuntos, de ficar perdido, de chegar ao fim sem saber quem foi o assassino :)
ResponderEliminare eu gostei deste teu comentário, Manel.
Eliminarobrigada. :-)