12/12/2021
Apeteceu-me ir comprar laranjas e fazer um post fofinho
11/12/2021
Raridades com poesia e cem testes em quinze minutos
Hoje é dia de Expresso, o jornal que eu peguei e li na cama antes do café e até o telefone, cansadíssimo de ser puxado pela gravidade, me cair em cima do nariz. Pu-lo de lado fartinha das tecnologias, nunca da leitura, mas o artigo sobre Dino d’ Santiago já cá cantava inteiro e Cabo Verde, esse cheirinho pouco, também. Doer, lá, só doeu ver os cães, não sei se já disse. E também, um bocadinho, não haver nenhum livro do Eugénio Tavares, nhô Eugénio, no café que lhe usa o nome e faz de livraria. Mas, segundo o senhor caucasiano da mesa ao lado na esplanada, podia encontrar na Biblioteca não sei se Municipal se de ordem superior, isto porque os dois exemplares raros que há dentro do café – tê-los-ia eu visto? – pertencem-lhe. Não os vi e não sei que senhor importante é este, dono de tão raros exemplares de poesia, mas agradeci, mais feliz pela conversa ali mesmo, com um estranho sem medo de me falar do que pela hipótese a visitar na paz de uma biblioteca, a qual terá de ficar para uma próxima vez.
Esta manhã entrei na Well’s para comprar uns óculos de ler
melhor mais fortes, pois é assim a vida: para novos é que não vamos. Na mala, trazia
já uma embalagem de cinco autotestes, parece que ainda vinha quente, acabada que
estava de chegar à farmácia do outro lado da rua, (tipo) estas também raridades estão
a esgotar todos os dias e lá poesia não trazem nenhuma. Escolho os óculos novos e ponho-me
a aguardar vez na zona de pagamento, ouvindo conversas alheias, o que segundo me
ensinaram é coisa muito feia, mas não sei porquê, dado que os ouvidos não se
consegue fechar com facilidade e não me ocorreu ser apropriado enfiar os dedos dentro
deles para me alhear do tema no ar:
- Tem autotestes? – o freguês antes de mim para a mocinha da
caixa.
- Não. Já não…
- E vai ter?
- Tente mais logo, ou amanhã… ontem vendemos cem testes em
quinze minutos.
Impressionante. E não só eu estava a fazer a coisa feia de ouvir
esta conversa, como também a embalagem de cinco autotestes dentro da minha mala
o estava, a mal-educada.
Além de não se ouvir as conversas, também não se fala com
desconhecidos, exceto quando se está sob o efeito daquelas ilhas mágicas vulcanizadas
em meio do oceano atlântico, onde se ouve crioulo e abundam sorrisos. Por isso
atirei a voz a este freguês, indo ele a caminho da saída.
- Na farmácia ali do outro lado têm, acabo de lá comprar uma
embalagem de cinco, só vendem de cinco….
O freguês parou, voltou-se e olhou para mim com seriedade.
- … e desculpe estar a ouvir a conversa.
- Ok, obrigada.
E, não parecendo nada entusiasmado, foi-se. Eu também. Mas só
depois de pensar que deve ser difícil ser cabo-verdiano em Lisboa e de pagar os
óculos novos que são mesmo lindos.
08/12/2021
Por falar em bolsos
Comecei “Viagem a Portugal” de José Saramago. Ler frases escritas por este homem é tão bom como era dançar a melhor das músicas. É belo como o nascer de um sol rosa no céu todo. É como, já que aqui estamos, saborear o gelado de baunilha d’O Poeta, restaurante na Praia, Cabo Verde, mesmo ao lado da Embaixada de Portugal e a cair para a praia com minúscula, uma das várias. Em baixo, o edifício vertical e miseravelmente triste que augura um casino chinês e está de obra parada, os vidros sujos do nada que há dentro, uma perversidade de obter riqueza junto a um povo que a tem sim, mas no coração, na alma e no olhar. Não nos bolsos. Ler Saramago é portanto experimentar sinapses com sabor a luz, é obter uma alegria em cada letra, encontrar sentido certo na travessa de carne a fumegar que lhe puseram à frente em mil novecentos e setenta e nove em Trás-os-Montes.
Anteontem fui ao Continente quase a correr por causa de trabalho a transbordar-me da agenda e da cabeça. Enchi o carro. Tarefa dificultada por uma das rodas que estava afligida de algum embate passado e impunha ao veículo de empurrar uma tendência arrastada de se desviar para a direita quando a curva era para a esquerda e ao contrário também havia esta implicância. Mas a solução trouxe-me o benefício de substituir a caminhada que não houve tempo de fazer nesse dia: parei o obstinado carro de compras entortado de rodas no meio do corredor junto às bananas e fui eu buscar o café, o azeite, o iogurte e o leite de aveia para a Saminhas, mas aquilo não é leite, um de cada vez, o sal para a máquina, comida para os gatos, contabilizando passadas para trás e para a frente com o vórtice junto às bananas, um cacho das quais também incorporei, uma embalagem de pescada do cabo número três, pão e ovos. Na caixa, já no fim de arrumar tudo de volta a este carro manco para regressar ao meu carro dos outros, elétrico, azul a condizer com os inspiradores eletrões, tão elegante, noto o freguês que a seguir a mim já pagava a sua compra de produto único. Um homem pequeno, nada novo, vestido com roupas velhas e pintalgadas de tinta, trabalhador das obras perto, possivelmente, meteu no bolso de dentro do seu blusão estafado o pacotinho de vinho tinto que acabara de comprar. Um pacotinho daqueles que posso usar eu, abundantemente, no coq au vin se quiser. Acordei a lembrar-me deste homem de compra única que vinha a seguir a mim na caixa do Continente. Por falar em bolsos.