27/11/2014

Coisa tão linda

Lavo as mãos e sento-me à secretária para continuar o trabalho. A caldeirada de pota do almoço libertou vapores aromáticos típicos que parece que vieram comigo. Concentro-me, calculo que isto já passa e o resto, que também calculo, não dá zero.

Despacho-me, há que estar pronta para a reunião das três, já sei como é. Isto feito tem de ficar e eu tenho de ir.

Enquanto teclo os cálculos, o zircónio que me brilha no dedo brilha-me no dedo. É a receita da primeira hora da tarde, a hora morta, pesada, fastidiosa, estica o dia para dentro de um bocejo muito comprido, espreguiço-me, vou mostrar.

(coisa tão linda)

Continua a cheirar a caldeirada de pota, mas eu lavei as mãos.

À minha esquerda, pendurada na parede, está uma das minhas obras de arte favoritas, para não dizer uma das minhas paixões, a obra que contém mais beleza, mais ciência, mais técnica, estudo e dedicação, um trabalho de uma grande equipa a tempos diferentes, uma pérola ainda incompleta, uma estrela: a tabela periódica dos elementos.

(pausa para sorrisos rasgados e inclinações amorosas de cabeças visivelmente enternecidas e um café se for rápido)

O zircónio elegantemente exibido ali em cima também está no retrato, tem o número quarenta, e portanto não resisto e levo o dedo ao papel, toco no quadrado onde mora o zirconiozinho que bonito e que cheiro a caldeirada.

Admiro o brilho desta pedra preciosa, hipnotiza-me ligeiramente, uma riqueza que me faz revirar a mão, inclinar de novo a cabeça em enternecimento já referido, esquecer por um bocado os cálculos do resto que não é zero antes que a reunião comece e ver melhor.

Ver melhor e bastante bem a grande mancha amarela muito suspeita com ramificações transversais nos dois sentidos, estrutura ligeiramente fractal, impressa na manga da minha bata de trabalho que não tirei para ir à cantina, visto que me fica tão bem.



(Isto é o que acontece quando tento escrever um post pequeno, curto, rapidez no consumo que há mais que fazer. O que demorou imenso foi a fotografia)

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