29/03/2017

Para além do pechisbeque

Estava há pouquíssimo tempo naquele trabalho e tinha documentos para ler, notas para tirar, outras para deixar estar. Aproveitei-me e li tudo o que apanhei com boa cara, incluindo o que era preciso e uma ou outra coisa do que não (todavia irresistível). Mas teria de interromper a leitura para uns dias fora em formação. Ora na véspera de ir, quis o acaso que viesse aconchegar-se-me na mão a definição da unidade de tempo que dá pelo nome de segundo. Li-a todinha. Eu, que aprecio pintura e arte em geral, mas que não creio haver obra mais bela que a tabela periódica dos elementos, fiquei aqui bastante bem impressionada. Não vou ver aos sítios em linha, vou escrever de cabeça, portanto cuidado: o segundo é o tempo equivalente a multiplicar por nove seguido de muitos algarismos o tempo de decaimento entre dois estados de energia do isótopo de Césio 133. Achei isto lindo, bolas.
Bem, no dia seguinte a esse entrei na tal formação, da qual faziam parte muitas pessoas desconhecidas, umas quarenta pessoas desconhecidas. E não é que a páginas tantas, estou a tentar encurtar o post, que estava a esticar-se o safado, não é que o orador, homem visivelmente cheio de si próprio, ok, não é que ele precisou de um exemplo giro para ilustrar o que estava a dizer e lembrou-se de ir buscar para ali o quê exatamente? A definição de segundo! E vai, todo vaidoso: o segundo é nove tal tal tal com muitos algarismos vezes o tempo de decaimento entre dois estados de energia de um qualquer isótopo de Césio. Ora uma pessoa saber isto ali assim, de cabeça e de repente, e descontextualizado – porque estava descontextualizado – não é pouco, é muito. Foi então uma onda de admiração na audiência, um silêncio inteiro, suspenso, que unificou as quarenta pessoas. O orador por dois segundos ou três dando tempo ao impacto de se fazer, ahá, apanhei-vos!, porém compreende-se. E eu agora?... Faço o quê?... Ele não sabe o isótopo, mas eu sei. Fico quietinha ou aproveito também eu para impactar um bocado? Pois tem de ser. Levanto o braço e, com licença, do fundo da sala, quebrando o silêncio inteiro, uno, todo ali: 
- É o Césio 133.


Por ter sido esta a única vez em toda a minha vida que fiz virar cabeças, muitas e ao mesmo tempo, por ter sido a única e ainda por cima tão fruto da sorte ou do acaso, isso agora não sei ao certo, esta vez em que brilhei para além do pechisbeque do anel ou dos brincos, por tudo isso, deixo-a aqui contada em quatrocentas e cinquenta palavras bem espremidas, que havia mais, paciência. Obrigada pela paciência.

18 comentários:

  1. E eu nem sabia o que era pechisbeque!

    Parabéns.

    E olha, o césio 137, há exatos 30 anos, causou sérias dores de cabeça aqui no Brasil.... E mais que isso.

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    1. Será que não se diz "pechisbeque" no Brasil?

      Fui ver o que o Césio 137 causou no Brasil. Que horror... de facto não tomar precauções com materiais perigosos pode custar a vida a muita gente. Pelo que li na wikipédia, já morreram 104 pessoas direta ou indiretamente. Espero que nunca mais aconteça.

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  2. Ave, Césio (isótopo)!
    Este blogue faz virar cabeças há muito tempo.
    E é lindo, bolas.

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    1. Este blogue, minha querida Teresa, estaria um chato não fossem os leitores cá vir manter-lhe a razão de existir. :-)
      (linda és tu... mas obrigada)

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  3. E como é lindo este blogue que me dá a conhecer o Césio. Eu que só conheço mesmo pechisbeque. :)

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    1. Ó menina luísa, quem quiser ver coisas lindas vai mas é a correr para a esquina da tecla. Essa é uma grande verdade.
      :-)
      (eu prefiro ouro ou prata a pechisbeque, mas não se pode ter tudo, não é?)

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  4. Reclamação:
    Podias ter deixado o safado esticar-se à vontade;
    A Teresa Borges do Canto já disse, este blog faz virar cabeças há muito tempo e ninguém consegue ver o tal pechisbeque;
    Paciência tem uma pessoa de ter, por exemplo, enquanto aguarda a sua vez para ser atendida numa repartição de finanças, num hospital ou centro de saúde, ou numa qualquer outra situação igualmente aborrecida e não enquanto está a ter o prazer de ler-te;
    Obrigada por nos falares do Césio 133.
    Fica um :-) (para atenuar a aspereza da reclamação)

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    1. Obrigada eu, Cláudia. Gosto de reclamações. São sinal de compromisso, de envolvimento. :-)

      E obrigada, muito, pelo teu comentário.
      Vai outro :-)

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  5. Nem li o post, espero ler quando tiver mais alegria, que é precisa, para ler-te.

    Ando super-triste.

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    1. Eu ia dizer-te, Diogo, para verteres a tua tristeza para um poema ou um desenho. Mas talvez já o tenhas feito (ainda não fui ler).

      Resta-me desejar que lhe encontres a fonte e lhe possas cortar as raízes.

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    2. Coloquei no blogue dois poemas que andavam por aqui no pc, já escritos há muito. Nem ânimo para mais tenho.

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    3. Tens ânimo pelo menos para vir aqui conversar, o que não é nada mau. :-)

      Tomara que isso passe logo, Diogo.

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  6. Hummm...não acredite nisso de ser esta a única vez que fez virar cabeças. Só aqui na net a minha já se virou para esta página uma data delas.

    Mas que desta vez o fez em grande, lá isso...

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  7. as coisas que tu sabes...consegues fazer com que o segundo dure meias horas?

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    1. Há meias horas que voam como segundos sem a gente querer e há segundos, peganhentos, que passam como se fossem meias horas também sem a gente querer. Tudo depende de quem estiver. :-)
      (Não, mas tu consegues, ana, tenho a certeza) :-)

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    2. (queria um método mais cientifico que me segurasse à terra)

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    3. Querida ana, um método mais científico para que um segundo se torne em meia hora, teria de te pôr fora da Terra, num lugar qualquer onde o tempo passasse mais devagar. :-)

      mas olha que tu parece-me que foste feita para voar.... mais do que andar agarrada à terra... :-)

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