- E tu és donde? Espanha?
- Ao lado, Portugal – respondi.
Larysa é ucraniana, tem o cabelo muito louro e quanto a mim
não mais de trinta e dois anos. Na festa de aniversário da amiga holandesa
comum, somos as únicas estrangeiras, sentou-se ao meu lado.
- Vives cá há muito tempo? – perguntou-me.
- Eu não vivo cá mas venho muitas vezes. E tu?
- Há dez anos. E agora já não saio daqui, tenho o meu
trabalho, os meus filhos e o meu neto, olha – e sem reparar que eu quase me
engasguei com o que estava a beber e lhe apontei os olhos muito abertos,
neto???, saca de um bolso qualquer, num gesto rápido, um telemóvel. Desliza os
dedos no ecrã e apresenta-me o bebé Alexander. Tem um mês e meio, não é lindo?
Mas eu ainda estou espantada à procura de uma ruguita no
rosto dela, qualquer coisa que me informe sobre a sua idade que pelos vistos
avaliei mal, não encontro.
- Avó?! Mas que idade tens tu?
- Lindo, o meu Alexander, não achas? – continua a ignorar a
minha pergunta e olha enternecida para o bebé que na foto é içado nos braços de
um homem novo de cabelo preto, e este é o meu filho, esclarece.
Não sei se alguma vez alguém disse a alguém que o seu neto
ou neta não, não é nada lindo, vais desculpar mas é feio como a noite dos trovões, é que não acredito. E não fui eu a primeira, até porque acho mesmo, verdadeiramente,
os bebés normalmente lindos. Principalmente se tiverem cabelo, como aquele
Alexanderzinho içado como um leitão.
- É lindo, sim. Mas que idade tens, Larysa? Diz lá… - eu queria
saber, na minha base de dados mental das características antropológicas,
ninguém com aquele aspecto podia facilmente ser avó sem ter tomado um atalho
qualquer, quem sabe avanços da medicina que me escapam, tanta coisa me
escapa.
Mas Larysa não me responde, talvez para os ucranianos seja ofensivo
perguntar a idade, pensei. No entanto, ela engraçou comigo, contou-me a
história dos seus dois ex-maridos, mostrou-me quão comprido já está o nome
dela, nós não podemos tirar os nomes dos maridos e somos obrigadas a pô-los, se
me casar terceira vez fico com um nome mesmo grande. E ri-se, está divertida.
Ainda tem o telemóvel na mão.
- Dá-me o teu facebook, assim podemos comunicar – pede-me.
- Facebook?... Eu não tenho facebook.
E pela primeira vez senti-me praticamente ostracizada por
não ter facebook. Foi a vez dela de me olhar incrédula, de frente, muito séria,
um ligeiro quê de piedade, o telemóvel suspenso na mão.
- Porquê?... Não tens internet?...
- Tenho internet, sim, dou-te o meu endereço de email, mas tu
vais dizer-me a tua idade… avó???
- Quarenta e três – eu não descodifiquei imediatamente, os
números em neerlandês saem ao contrário, é três
e quarenta o que ela diz.
- Iiiiii… não pareces…
- Ponho um creme. Chega bem. E o meu cabelo não é loiro, é
escuro como o teu, eu é que o pinto, o ano passado estava ruiva, olha –
largou a informação remanescente, esta não inquirida por mim, visivelmente
divertida, exibe de novo o telemóvel com uma Larysa ruiva e eu percebi que já
deve ter testemunhado reacções como a minha diversas vezes.
Depois, inclinada sobre mim, falando mais baixo como que em
confidência, diz-me, olha, até a minha mãe, lá na Ucrânia, tem facebook.
- E a tua avó? Também tem? – eu também sei brincar e antes
que ela julgue que aqui no Portugal toda a gente é saloia como eu, atirei-me
ferozmente à plateia de holandeses e lancei a pergunta: quem aqui não tem
facebook?
A maioria. Safei-me, Larysa.
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