14/04/2015

Almofarizes assassinos e palavras cáusticas

São quase dezanove horas. Saio do edifício e puxo a porta atrás de mim. Sei exactamente a força que devo aplicar-lhe, sem me virar, para que ela se feche com um clique mínimo mas suficiente. A minha alma, olá alma, está aqui fora à espera, apanhaste chuva, afago-a, apanhei chuva, diz sorridente (nós gostamos de chuva).

A alma fica o dia todo fora do edifício por precaução. Acorrentada às horas mas livre ao ar, está a salvo de almofarizes assassinos e palavras cáusticas. Fiel, no reencontro do fim do dia, veste-se de mim outra vez. Serve-me com a cócega vertical na barriga e eu arrisco-me a ficar estupidamente feliz. Lança-me na vertigem de um novo nascer e é por isso, talvez, que cheira a setembro.

A cinquenta metros de nós, os carros deslizam no alcatrão molhado e morno. É dali que vem este aroma viajado. Acabado de chegar e de cruzar os meses, foi enviado pela mesma chuva que inaugurou o ar tão cansado do verão. Setembro cheirou tão bem. Lembras-te?

6 comentários:

  1. Que triste, querida Susana.
    Fraca companhia para dias de todo o ano.
    Beijos,
    Outro Ente

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    1. A tristeza que deitamos nas palavras é como se fosse chorada, sai. É uma das vantagens de ter um blogue, querido Ente. Não acha?
      Beijos retribuídos.

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    2. Querida Susana,
      Será uma das vantagens. Outra, mais simples, será apenas (est)a partilha.
      Desejo-lhe uma boa noite,
      Outro Ente.

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    3. Oh sim, a partilha. Sem dúvida.
      Muito obrigada. E eu desejo-lhe um bom dia, querido Ente.

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  2. Às vezes, a alma também tem de ser amparada e resguardada. Tem de ser guardada como um tesouro, protegida de almofarizes. Quando a voltamos a vestir, renascemos para a vida.
    Um beijinho

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    1. Olá Miss Smile, bem-vinda! Apanhaste o ponto, o da alma. Inteirinho. :-)
      Outro.

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