15/10/2020

O prato, ainda

Como o almoço no prato único, desprovido do estampado há muito pelos ciclos da máquina de lavar. Como no prato que não encaixa nos demais, na prateleira, guardando espaços esconsos acima e abaixo dele. Como o almoço na luz da cozinha deitada ao rio do costume, se bem que mais a norte, aproveitando agora com rugas nas minhas mãos, sim, o molho da caldeirada que inventei da mãe e uma fatia do pão de mafra. Como sobre os azuis desenhos adivinhados deste prato de outrora, roubando-te por um instante à eternidade com a memória da tua sopa que dava o aroma às manhãs na minha pequena existência cozinhada ao teu lume, avó.

11 comentários:

  1. Quando vou à casa que era dos meus avós paternos, como na loiça que era deles, como também pão de Mafra, também me lembro de uma sopa que a minha avó me faziam que eu adorava e que nunca mais comi igual.
    E em certos dias de inverno, há no campo um cheiro que não sei descrever (não sei escrever bem como a Susana) uma mistura entre cheiro de lenha e terra molhada que me lembra a terra da minha avó materna na Beira Baixa.
    É assim a memória.

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    1. Eu acho que descreveu muito bem o cheiro, porque eu até quase o senti, Ana!
      Os avós podem ser tesouros que nos acompanham toda a vida, mesmo quando eles já cá não estão.
      :-)

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  2. Pouco convivi com os meus avôs. Das poucas memórias que tenho é do meu avó olhanense comer todos os dias uma laranja, do cheiro da fruta, até chegar a Portugal praticamente desconhecida para mim. Era um velhote seco, rijo e que até ao final da vida andou de bicicleta. Cheia de ternura esta sua memória, bonito...
    ~CC~

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    1. Pouco conviveu mas contou-nos uma história tão bonita do seu avô! Obrigada, CC.
      Eu gosto especialmente d ever velhotes de bicicleta e constatar como são saudáveis e, sim, secos, rijos. (Na Holanda vejo muitos, eles e elas) :-)

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  3. Sabes, aquilo do "Encolho-me", acontece mesmo. Encolhi-me quando li este teu post logo no dia em que aqui apareceu.
    Quando não estou a conseguir encontrar as palavras, ou cozinhá-las como queria, para poder passar para quem escreveu a noção do quanto gostei de ler, ou, em muitas outras situações, de como me desinquietou para pensar, encolho-me.
    Mas, neste post, quero muito deixar-te um comentário, faço questão, então estou aqui a fazer por ultrapassar encolhimentos...
    Pois ainda, ainda...
    Tens aí, Susana, e, ainda por cima, bordado a poesia, cá um pedaço de homenagem!

    (Tens noção das maravilhas que andas a escrever, miúda?)

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    1. Ah! Sabes que me acontece quase sempre isso (a que chamas encolher) com os teus comentários, Cláudia! Difícil responder à altura. E invariavelmente penso que uma conversa é que era. Daquelas ao vivo, cara a cara. Enfim.
      Muito obrigada pelas tuas (mais uma vez!) tão generosas palavras!
      Mas poesia... poesia? Hum, algo ainda mais difícil de definir do que amor. (aliás não vejo onde está a dificuldade de definir amor... e esta hein?) :-)

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    2. :-) ("buéda" largo)

      (ai, mas agora, mesmo assim sem cara a cara, assim mesmo agora para já, queria tanto que aparecesse aqui a tua definição de amor)

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    3. Definição de amor:
      O amor é uma entidade muito forte composta por duas partes: uma estática e uma dinâmica.
      A estática assume a forma de um sentimento que nasce num coração e tem por objeto alguém (vamos deixar o amor pelas coisas de lado).
      A dinâmica assume a forma de um verbo: amar, é o exercer do amor. amar é deixar o amor que se sente fluir, ser exercido, para melhorar de alguma maneira o mundo da pessoa amada.
      e há, claro, muitas formas diferentes de amor, para isso fica para a segunda sessão. :-)

      Bem, esta é uma definição um bocado técnica. mas é o que me faz crer que, em vez de dizermos a alguém "amo-te", seria muito mais valioso esse alguém diser-nos: "amas-me", assim, afirmando. porque seria a prova de que o nosso amor por essa pessoa tinha lá chegado ao coração dela.
      Pronto, nem vou rever o que escrevi, Cláudia, fica assim, em bruto.
      :-)

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