"Grandpa needs to finish it himself," was her answer. "It's sour."
28/08/2024
Jopie Huisman 4/5
These knickers have been mended dozens of times. To me, they're the most moving item of clothing I ever found in the rags.
She always tried to mend them with yarn that as far as possible matched the colour of the knickers themselves.
Jopie Huisman 3/5
Jelmer is my cousin and my closest friend. Whenever I see him or think of him, it evokes everything that is good and gentle in me.
One time, in the television programme 'De Stoel', the host Rik Felderhof asked Jelmer: "What's the deal, Jelmer: don't you two ever disagree?"
To which Jelmer answered:"Quite often."
"So how do you solve it then?"
"It's very simple," said Jelmer. "I start walking in one direction, and Jopie in the other."
To which Rik said: "And how long does that take?"
27/08/2024
Jopie Huisman 2/5
The best comment I ever got about this painting was made by the poet Rutger Kopland.
He wrote: "The heart of the painting is the pale, motionless face that looks away from the mirror.
It isn't the face of a painter, but of a rag-and-bone man.
A rag-and-bone man who's rolling a cigarette before posing for his portrait.
Taking a breath for a moment - forever!"
Jopie Huisman 1/5
"I wore these shoes for almost 40 years, " is what old Yde told me.
He actually could have afforded new shoes - because he was already getting a pension - but it was hard for him to take leave of them.
Later on, I traded him a bottle of brandy for them.
The brandy is long gone and Yde has passed away, but I got to draw his shoes.
Jopie Huisman
Jopie Huisman foi o sétimo e último filho de uma família com escassos recursos materiais, mas abundante em amor, como ele próprio descreve. Nascido em 1922 na pequena cidade de Workum na região Frísia holandesa, Jopie sentia-se tão absurdamente encantado com as planícies fartas em água, paz e vegetação luxuriante, que cedo começou a pintar a beleza que lhe entrava pelo espírito adentro.
Ao longo da sua vida, foi apurando o olho para outros encantos que descobria em objetos caseiros sobretudo se fossem usados, ou muito usados, pois só assim se podia neles ler a história que carregavam. Veio a falecer no ano 2000, não longe do lugar onde nasceu.
Nunca quis vender nenhum dos seus trabalhos, apenas aceitava expô-los, até ao dia em que três dos seus quadros foram roubados de uma dessas exposições.
Hoje, à exceção desses três que foram furtados, os seus quadros estão expostos no museu, em conjunto com as histórias que contam, na sua cidade natal.
26/08/2024
Férias
Tudo está a conjugar-se. Não deixei pontas de trabalho para os meus colegas, daquelas que me impedem de descansar a cabeça toda. O tempo tem oferecido um leque razoável entre o vento e a calmaria, o sol e a chuva forte, a água agitada e o espelho onde deslizam patos, gansos, galeirões. Visitei um pequeno museu numa pequena cidade, como se visse à lupa o olho de um malmequer cravejado de minúsculos seres vivos. No supermercado, deram-me o troco em moedas para pagarmos as pontes levadiças se não for grátis fazer subir alguma. As minhas avaliações quanto à altura do barco e das pontes fixas em aproximação não falham: o primeiro passa sob as segundas, ainda que sobrem apenas dois ou três centímetros em alguns casos. Afrouxei a dieta no sentido de gelados, sobremesas e o bolo com morangos em excelente forma, sem no entanto ter engordado. Em Portugal todos estão bem, incluindo os gatos, e não há incêndios (o tremor de terra não foi nada). Finalmente, para cúmulo da perfeição, trouxe um livro comprado na Feira de Lisboa, fruto de um impulso um bocado arriscado e doido, um livro que não consigo largar. Quer dizer, conseguir consigo, mas por pouco.
Por outra palavra, fui.
18/08/2024
Isto, isto
Pessoas caminham três cães ou dois, enquanto as vacas arrancam a erva molhada de domingo e no prado as éguas estão silenciosas, mas só com as moscas. Um galo insiste, ao fundo inteiro da estrada, no orvalhar de algum minuto que já esqueceu. Além disso, dois pombos, ao alto, esticam o pescoço bicudo para o voo urgentemente rasgado à sua frente.
E eu, depois de um bocado da manhã às voltas, depois das calças acabadas de lavar, depois de, por cima do molhado da erva alta, colher a única amora madura à beira do caminho, depois, até, da lebre saltar sobre as flores e as flores e as flores silvestres em cheio, em rosa, em azul, e depois, ainda, de me sentar num banco tão vazio, eu não sei o que fazer com isto.
14/08/2024
Misericórdia?
O céu acalmou. A manhã avança docemente numa luz cristalina e ténue vencendo, a espaços, as nuvens quietas que a tempestade de ontem não desfez.
Acordei cedo. Hoje é o meu último dia de trabalho antes de férias, ocasião que me dispõe lindamente.
A olhar o jardim através da grande janela, muito encantada com a luz, o complexo de nuvens e tons, cenário que justifica perfeitamente o conhecido ardor do pincel dos pintores flamengos, pus-me a pensar.
Qual terá sido o livro sobre um lar de velhos que a mulher do senhor Pereira trazia na mala*? Livro esse que entediou uma leitora exigente e experiente, como a querida MP?
Misericórdia, de Lídia Jorge?
A máquina de fazer espanhóis, do Valter Hugo Mãe?
Os esquecidos de domingo, da francesa Valérie Perrin?
Estes três vieram-me à cabeça com o prado verde ali mesmo à frente, tão belo, todo ele agosto, mesmo intenso.
Mas vou mais no primeiro. O do Valter Hugo Mãe já é antigo, o da francesa não levará MP a mergulhar nele, talvez. Ou é um qualquer outro cuja existência desconheço. Enfim. A verdade é que estou aqui diluída no verde, na manhã, nas nuvens, e nos livros sobre lares de velhos, antes de me pôr ao trabalho.
Mas Misericórdia não me atrai, precisamente porque desconfio que me iria entediar.
(certo será que Em nome da terra entrou para a lista, aliás, já lá estava, mas subiu uns lugares na prioridade, subiu, subiu)
*13.8.2024
10/08/2024
Os arados
Hoje começa a festa da vila. Primeiro tomamos café no lar de idosos, que tem mais espaço, às nove e meia. Anunciam-se as novidades, os novos residentes da rua são apresentados. Alguém distribui as folhas já um pouco amarrotadas com a canção. É uma espécie de hino. Eu vou fingir que canto, tenho sempre vergonha da minha péssima voz. Como a letra está no holandês que acho que nunca aprenderei decentemente, a coisa vai disfarçar melhor, tenho desculpa. A seguir vamos montar os enfeites da rua. Todas as outras ruas fazem o mesmo, mas tomam o café noutros lugares, devem ter os seus hinos.
Será, como sempre, uma atividade de equipa. Os enfeites são pesados, altos postes em madeira, é preciso remover uma pedra do passeio em frente de cada casa para os enterrar bem, vão lá ficar uma semana. Os homens fazem esse trabalho, algumas mulheres também, duas a duas consegue-se. Depois martelam-se as estacas que prendem as faixas laranja ao chão, combinando com as faixas encarnadas, brancas, azuis que pendem verticalmente. As cores representativas do país. Não ficam muito lindas umas com as outras, mas nestas situações de festas da vila aceitam-se melhor os folclores, ninguém se vai importar com cenas chatas de estética e tipo isso.
Vai ser a primeira vez que montamos os enfeites com o vizinho irrequieto, barulhento e até agressivo, aquele do absurdo cortador de relva. Como serão os seus dotes de cooperação?
Muito antes da hora do almoço, a rua estará pronta. Cada poste de enfeite ostentará um arado de madeira, cem por cento inspirado no nome da rua, cem por cento feito à mão por um vizinho que mais tarde se mudou para a Noruega depois de ter enviuvado. Acho que são quase trinta arados que todos os anos saem das garagens, cada casa tem o seu, e voltam a erguer-se nos seus postes. Ele deve ter sido carpinteiro nas horas livres. Ainda conheci a sua mulher. Vieram ambos dar-nos as boas-vindas no verão de dois mil e dezoito, quando chegámos. Trouxeram de presente uma espécie de cabaz de natal mas em agosto. Tomámos café no jardim, apresentámo-nos, falámos das nossas vidas, contámos dos filhos, das nossas idades. Ela era uma senhora muito bonita, lembro-me de ter pensado como aos setenta anos se pode ainda ser tão bonita. Num braço, tinha uma faixa branca, um grande curativo. Disse-nos que era o cancro, que iria morrer em breve. Disse-nos isso com uma tranquilidade própria de quem fala de dias felizes, não da sua morte iminente. Morreu em dezembro desse ano.
Sempre que chega este sábado de agosto e participo na decoração da rua, martelo as estacas das faixas laranja, ajeito o enfeite com o arado de madeira pregado no poste, penduro as luzinhas que, ao final da tarde, se acendem com as suas bateriazinhas, sempre que chega este sábado de agosto, dizia eu, lembro-me desse vizinho viúvo que se mudou para a Noruega. Penso em como ele estará e se alguém daqui, algum outro morador mais antigo, lhe envia fotografias dos seus arados a enfeitar a rua, depois do trabalho concluído.
Mas hoje vou perguntar.
07/08/2024
Galinheiro sem galo (aparentemente)
Fechei o computador e debrucei-me na janela. Vem um ruído astronómico do lado do vizinho irrequieto. Vejo-o então manejar um maquinão de cortar a relva e fazer estremecer, sei lá, o pavimento da rua, senão mesmo os vidros das casas. É completamente desagradável. Nem a trovoada que rebentou de manhã conseguiu lançar tanto decibel. Mas não quero queixar-me, sempre posso correr escada abaixo e porta fora e só parar no adro da igreja onde talvez já não se oiça o rugido imenso.
Mesmo assim, antes isto que vê-lo a fazer chichi para as hortênsias em flor, plantadas ao canto do seu jardim, do lado oposto ao do novo galinheiro. Blhec.
04/08/2024
Descascar horrores também podia ser (mas é descansar)
Dois mil quilómetros separam-me do minúsculo tubinho de plástico flexível com os restantes microlitros do soro fisiológico com que, ainda ontem muito cedinho, lubrifiquei os meus olhos.
Microlitros que agora iam bem nesta hora pós-sesta (no âmbito da qual se propagam os ruídos aspersores da máquina de lavar loiça). Lentes de contacto e uma ranhosa necessidade que se me entranhou de descansar horrores não combinam.
Além disso, para um minúsculo tubinho de plastico flexível, dois mil quilómetros é muito.
02/08/2024
Ah, Lisboa em agosto
O autocarro corta Moscavide a direito. Vai na bisga. Tão depressa que nem me dá tempo de explicar melhor a sua velocidade.
Mas é agosto. E Lisboa está já, em grande parte, a descansar no Algarve ou na República Dominicana. Não sei se ainda se usa ir para a República Dominicana. Porque é preciso fugir às torturas de Albufeira.
Na Praça José Queiroz quase sou cuspida do banco. O veloz autocarro contorna a estação de serviço servindo-se - que lindo isto - do seu fole de ajuda ao longo do veículo. Não dá para escovar isto melhor, já estou um bocado enjoada.
Escovar, não, explicar.
O telefone esperto não me salta da mão nas travagens, porque eu sou mais, muito mais, que ele. Daí o post, ainda que aos arrancos.