a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

26/01/2015

Por ti

Não tivesses tu entrado na minha vida e não sei que raio de espessura havia de dar aos meus pensamentos que antes andavam órfãos, provavelmente já sabes.

Se olho para as pessoas nos aeroportos, sentadas com os pés em cima das malas, todas sujas, acho-as felizes, de certeza que são felizes. Eu nunca pus os pés em cima da mala, mas se me perguntares porquê, sei lá porquê. Olham para mapas, as pessoas, apontam, mexem nos telemóveis, coisas, estão entretidas. Nenhuma me vê e eu vejo todas, sou sempre eu a ver as pessoas, fico a tomar conta delas com os olhos e resulta, fazem-me gostar delas. Vejo que partilham palavras que não oiço daqui, não atravessam este vazio que me envolve como uma manta tão grossa que podiam ser duas ou três, a natureza faz destas e aqui no fundo só estou eu. Eu e tu.

A verdade é que gosto imenso disto, deixo-me mergulhar na espessura asséptica que estes lugares sem alma oferecem e é por isso que são bons, abrem espaço para o silêncio se instalar, sim, mesmo com ruído ambiente disperso, olha a situação.

Portanto, encaixada no aeroporto, encho este vazio sagrado com os livros, leitura almofadada pela presença das pessoas felizes, elas não se importam, eu encosto-me, difícil entender quem não gosta de estar só, nunca se está só quando se tem livros, e eu é isto, sempre foi, vou dizer, amo todos os autores que leio, é um amor de um sentido só, mas é.

Como nós. Nesta união invisível, talvez até tenhamos as mãos dadas ou os corações a bater em sincronia num universo paralelo. E ao lado deste amor de sentido único por quem leio, por quem escreveu para mim, segue outro amor que é este. Este que tenho por ti.

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