a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

07/01/2015

Toda partida

O Herberto Hélder não me põe maluca porque isso já dizia a minha avó que eu sou. Mas praticamente.

Faço planos sérios de me formatar o entendimento para encaixar nem que seja a martelo as ondulações das profundezas da poesia. Ou isso ou esticar os neurónios, dar-lhes plasticidades novas a fim de lhes conferir o número quântico de graus de liberdade que há que ter na alma para apanhar a ideia, qualquer das duas penso que dá. Os versos do Fernando Pessoa por exemplo já sim, depois de os ler cento e três vezes, entraram, felizmente. Um alívio.

Esta introdução não se fez para aborrecer ninguém, fez-se para dizer a seguir umas coisas como esta, que agora me deito com um frio que não se pode e ajeito nas mãos o grande Herberto Hélder, que é como quem diz, um livro dele novinho em folha, aberto numa página de poesia, eu com a coragem que estou. Li duas vezes o primeiro verso e fechei os olhos a tentar visualizar.

Nada.

Abro-os de novo, deixa cá ver, leio mais uma vez, um esforçozinho, a ver se dá... E é aqui que começam as cambalhotas apocalípticas – está visto que apocalípticas roubei do livro dele mas foi mais à frente, numa consulta ao médico, que eu palavras destas não trago no bolso – apocalípticos, agora fica assim, dizia eu, são os contorcionismos a que me obrigo nas arestas daqueles versos que o mestre escreve e que eu vejo que são mesmo bons versos, nunca tais combinações de motes me passariam pela cabeça nem que vivesse oitocentos anos, mas admito que nasci com curtezas neste campo, daí as cambalhotas.

Portanto, eu gostaria de fazer um pedido para dois mil e quinze que era criar-se aí nos blogues um curso de leitura e compreensão de poesia, com ênfase na parte da compreensão, por favor, para cabeças pouco plásticas como a minha, ainda que muito giras noutros aspectos, dependendo dos gostos.

Mas voltando ao momento que ficou suspenso ali atrás  – lembro que tenho o Herberto Hélder a dar comigo em doida com as páginas de poesia apocalíptica, cá está – corro então muito depressa umas folhas para a frente até me encontrar a salvo dentro de uma prosa do mesmo mestre, evidentemente, não percamos este detalhe de vista. E pronto, estou em casa, por acaso já estava, mas a metáfora meteu-se ali e deixamo-la ficar. É que na prosa percebe-se tudinho tudinho o que lá está escrito, uma escrita que dá um gosto tão grande, e eu então parto-me a rir, era assim que dizia o meu pai, hoje refiro a família toda, parto-me a rir por ali fora.

São poucos, pouquíssimos, os autores que me fazem rir; o meu sentido de humor é duro de roer, normalmente não se encontra e uma pessoa vê-se e deseja-se para rir um bocado quando lhe apetece, mas isto sim, estas prosas do mestre Herberto adoro-as tanto.

E depois, toda partida, acho que caí no sono.

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