Ao almoço comi meia batata cozida de cor acinzentada em certas partes, um pedaço de frango seco, duas meias cenouras também cozidas, um bocado de nabo do tamanho de um caramelo, e duas colheres bem servidas de couve lombarda fria. Era o prato da dieta intitulado cozido simples.
A parte de que mais gostei do cozido simples foi a do caramelo. Depois de comer, saí da cantina e fui a casa colher a minha flor mais nova, que é como quem diz a minha jovem filha, para irmos aos registos e notariado, que interessante é escrever isto, registos e notariado, renovar o cartão de cidadão dela.
À chegada estava uma ventania desgraçada que varria tudo no belo campus de justiça, que se atira para o rio, de forma que difícil foi atravessar com graciosidade aquele pátio central com o chão cheio de fendas que tenho a certeza têm origem bem assente nos mais conceituados designs da época moderna e se estendem até ao edifício dos registos. E do notariado.
Sessenta e seis pessoas à nossa frente não nos demoveram, instalámo-nos. Pensei que pena foi não ter trazido o livro para me entreter, mas a força de juventude ao meu lado tratou do assunto nos primeiros minutos. Oiço, então, mais uma vez, o relato daquela parte do concerto de sábado no coliseu em que o James Arthur pergunta se há por ali alguém in love na assistência. O meu rebento, que segue a narrar, esperou que a histeria reagente à pergunta acalmasse para se elevar acima de todas as vozes e com toda a potência torácica disponível, num I am in love with you ao que ele, o próprio James Arthur, o James, vá, terá respondido, as mãos enroscam-se uma na outra, abrem e fecham, os olhos chamejantes fixados em mim, ai mãe ouve lá o que ele me disse, ouve lá outra vez, eu ouvi o que já tinha ouvido, algumas vezes, ouve lá mãe, disse-me a mim, a mim, I am in love with you too.
Depois regressou ao mundo atómico do seu ipod comprado em segunda mão no olx e eu adormeci.
Penso que foi do acinzentado da batata.
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