Ainda não são seis horas, pelas frinchas da janela passa uma claridade fraca. Levanto-me e acerco-me dela, mostra lá o dia, ó janela, toma nevoeiro, queres nevoeiro? Não, hoje quero mais sol, podia ser junho para hoje? Mas é nevoeiro que temos, talvez um farrapo de dezembro ou de fevereiro, e do espesso: bom, perfeito para poemas místicos de feiticeiros, elfos e cavalos alados, mas isso não é aqui. Aqui arde-me o peito. Lá fora, a espessura branca barra-me os olhos, não os deixa cair no vale, ó janela dá-me junho. Varro, então, as folhas da palmeira que nasceu aqui de conjugações naturais ou forçadas, desconfio que forçadas. Varro-lhe as folhas com os olhos, uma árvore é uma árvore, mesmo que seja destas, fora da caixa, ó janela, as folhas enormes brilham da saturação que o ar não pode mais conter, estão molhadas, molhadas. Levo a mão ao peito e sinto-lhe o ardor que não está dizente com este fevereiro, um dia assim e o meu peito a arder. Isto não é poesia, desenganemo-nos já, que aqui não temos poesia, aliás aqui temos muito pouco. Arde-me o peito por ter adormecido ao sol de ontem, que o houve, se houve!, e que me queimou a pele. Abandono a janela ao nevoeiro espesso, adeus janela, e imagino, quase invejando, que do outro lado talvez seja esse verão, atrás do qual me vejo correr. Na casa-de-banho, dentro do armário, está o creme que espalho no ardor do peito e no espelho, à minha frente, encontro o mesmo tom vermelho no nariz e na testa, ena! olha uma índia. Passo o creme também aqui, e regresso ao quarto. Viro as costas de propósito à janela e pego no telefone esperto que, afinal, coisa rica, é uma janela maior, uma janela para o mundo, deixa ver, queridinho, diz lá as horas, dizes? Noto, então, num cantinho desta janela, um sinalzinho na zona destinada aos sinaizinhos do telefone esperto e vou lá ver o que é, mostra lá isso
tic.
Duas horas até ao trabalho - queria o sinalzinho dizer num dia feriado no meu trabalho e, não contente com isto, ainda tem outra mensagem, ó que maravilha: um lembrete, não fosse eu ter enlouquecido ou assim, de que hoje é o aniversário da minha própria filha.
Nem é isto um junho nem o meu telefone é esperto.
(para castigo de ambos, fica um pedaço do junho que ontem esteve aqui)
E será possível deixar os parabéns à aniversariante e à mãe, ou à mãe e à aniversariante -- que a ordem dos factores é comutativa, em caso de tal efeméride?
ResponderEliminarOh sim, claro que é possível!
EliminarQuanto à aniversariante, ser-lhe-ão entregues os votos, que esta mãe aqui agradece já em direto: Muito obrigada, caro xilre. :-)
parabéns Susana! também eu ponho lembretes para os aniversários dos meus filhos...eles nem sonham... :)
ResponderEliminar(tão bom ler-te. faz-me sentir tão gente :))
ana... glup... eu sei o aniversário da minha filha e ... o telefone lembrou-me porque é doido, eu não lhe pedi nada...
Eliminare agora?... já não gostas de mim?... (snif)
(mas eu sei o dia do aniversário de toda a gente, até sei o teu, sabias? :-))
beijinho, querida ana.
eu já me esqueci do aniversário de um dos rapazes. disfarcei bem, claro...
Eliminarclaro que gosto de ti :)
mas o meu...eu sei que é um número muito bonito, mas mesmo assim...
Então muitos parabéns às duas. ;)
ResponderEliminarE muitos beijinhos às três. Ou quatro. ;)
Obrigada, Gina :-)
Eliminar(quatro)
Toda a gente agradece.
Beijos de volta, muitos.
"Ardes-me no peito onde a custo
ResponderEliminaro meu amor perpassa, e vai até
às loucuras do corpo
e às agruras da alma.
Ardes-me no minuto, no segundo,
na hora amaciada por olhos entrevistos,
ardes-me no sangue obstruído
e na certeza muda que me diz
que o coração existe."
Pedro Tamen
Quando li pela primeira vez este poema do Pedro Tamen, pensei no meu filho. Só poderia estar hoje também aqui. O teu post é lindo e fez-me lembrar esses dias em que o peito, simplesmente, arde.
Parabéns, querida Susana.
Eu logo vi que isto de um peito a arder dá logo para a poesia. :-)
EliminarObrigada pelo poema, querida Teresa. Um poema sabe-me sempre a um fruto. Este é um fruto agridoce, irrequieto e quente.
Um abraço, e que tenhas um dia bonito, como tu.
Está mesmo, mesmo lindo este post, é assim coisa para me calar o comentário não fosse a vontade de dizer-te:
ResponderEliminarParabéns, querida Susana.
Que os meus posts nunca te calem os comentários, Cláudia. :-) A este eu perdoo, pronto, mas não voltarei a perdoar a um post tal façanha. Tu és das pessoas que não se devem calar!
EliminarObrigada, querida Cláudia, e um abraço, apertado.
Com um dia de atraso, uma grande beijinho para ti, minha linda, e para a tua menina. Muitos dias felizes, com toda a alegria do mundo.
ResponderEliminarBeijinhos :)
Esse teu sorriso nunca está atrasado, Miss Smile. :-)
EliminarMuito obrigada e beijinhos de volta.
Pode o dia de junho( que já passou - pois chego quase sempre atrasada a estas festas...) estar a imitar fevereiro, pode ficar com cara feia, pode o que ele quiser porque, tratando-se do dia de aniversário de um filho, neste caso filha, em nada deixará de ser o dia mais lindo de todos. :)
ResponderEliminarParabéns!
O dia do aniversário de um filho, ou filha, é um dia para se celebrar do melhor que a vida nos dá.
EliminarE tu, minha querida luisa, nunca chegas tarde.
Obrigada :-)