a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

27/11/2013

Cancela

Hoje tive a certeza, anda alguém a trazer para aqui vasos com flores.

Entro com o carro e passo na cancela que se levanta todas as manhãs muitas vezes, uma delas é para mim, ao chegar ao meu local de trabalho. Viro o volante à direita para fazer a curva apertada do costume, todos os dias é isto, mas hoje tive a certeza: o número de vasos com flores, alinhados no murinho do qual me desvio se não quero raspar o meu veículo outra vez, que não quero, tem vindo a aumentar e hoje compunha um alinhamento de alto lá com ele, coisa bonita. Pena tenho de não me ter ocorrido tirar uma fotografia para postar aqui e trazer o florido às nossas vidas (à minha, que escrevo, e à do meu querido leitor ou da minha querida leitora, que lê), mas pensando melhor ainda bem que não tirei as mãos do volante nesse momento crucial de viragem do dia. À falta de foto puxemos, portanto, pela imaginação.

Desconfio do porteiro.

Aquele é homem de saber apreciar a vida. O seu gabinete de trabalho, não lhe vou chamar casota, dentro do qual está o botão que ele prime para fazer levantar a cancela dos bons dias, e que eu imagino ser vermelho, deve ter uma área não superior a meio metro quadrado. Se não fosse a cortina de ripas horizontais a descair para um dos lados, pendurada na janela de dimensões ridículas, imaginação para que te quero, mais uma vez, aquilo faria lembrar uma casa de banho das que aparecem no Rock in Rio e por aí.

Ora o nosso homem tem sempre assunto fresco com que nos entreter, se calha alguém se demorar mais na saudação à passagem. Versando habitualmente pelas áreas das medicinas alternativas, não há dor que se faça passar por debaixo da cancela que eu já referi e que um dia foi ornamentada com riscas enviesadas brancas e vermelhas, pois não há dor, como eu dizia, para a qual ele não tenha remédio.

Foi assim que conheci as bagas goji.

Passa-se isto muitíssimo antes de a cadeia de supermercados onde me costumo abastecer, em visitas rápidas demais que me fazem normalmente lá voltar porque faltou a pasta de dentes, as descobrir, às bagas.

Tendo conseguido este homem convencer alguns dos meus colegas mais temerosos, passei a ser espectadora da ingestão das ditas bagas à mesa da cantina, que sim senhor, isto é coisa que faz bem a tudo, precisar o detalhe faz-bem-a-quê é que eu já não posso, que se me varreu. Lembro que se passa isto há muito tempo.

O que posso afiançar é que as bagas goji não emagreceram ninguém, não fizeram aumentar nem diminuir a produtividade de ninguém e não rejuvenesceram alguém, que ninguém estava a ficar repetido.

E deve ser por isso que este homem, que quer é o bem de todos nós, se dedica agora a alindar-nos a entrada.

Amanhã paro debaixo da cancela e pergunto para que são as flores.

É que estou a precisar de um remédio para a curiosidade.

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