a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

06/08/2015

Post para corações grandes e mentes não muito sedentas de literatura (estou receosa)

Nos blogues não contamos tudo, que tudo é muito. Contamos o quê então? Ah deixa lá ver, vai isto, que leva embrulhado uma ou duas das minhas mestrias, de preferência com uma corzinha mais puxada, um brilhozinho, uma pitada de sal, um molhozito de coentros se estivermos no Alentejo, se não estivermos pode ser outra coisa qualquer que cheire bem, mas eu lembrei-me foi do Alentejo, e ainda com uma generosa lente de aumento, é assim que nos blogues contamos. Caindo que nem uma luva no meu caso, admito que tenho vindo a construir uma imagem verdadeiramente beneficiada da minha pessoa, agora que olho para a edificação que resultou neste blogue, já nem a minha família me reconheceria, tantas são as maravilhas de que aqui sou feita.

Por conseguinte, hoje é dia de repor verdades, coragem.

Eu não sou, nunca fui, uma fabulosa cozinheira. Na verdade, sou mulher capaz de trocar a cozinha, o aspirador ou o ferro de engomar por contar uma história a um sobrinho, conversar contigo, por ler ou dançar (se bem que dançar com o ferro de engomar é possível até certo ponto, com o aspirador é que não por causa do barulho) e a verdade, no meio disto tudo e sem pestanejar, é esta: eu não pinto as unhas.

Quando era nova, tentei. Esforcei-me. Mas a operação acabava sempre mal, não só devido ao extravasar do verniz para as áreas circundantes, onde já se pode dizer que é dedo, mas também porque ficavam-me depois coisas coladas às unhas, objectos mínimos que identificava pertencerem ao pêlo do sofá, da minha camisola de lã ou de um cobertor que andasse por ali à mão. Isto acontecia, está-se mesmo a ver, porque eu não lhe dava, ao verniz, tempo de secar (permitiu-me porém aprender que é daqui que vem a expressão “isto é uma seca”).

E há uma pergunta que se pode ainda responder: mas afinal não gostas de unhas pintadas?! Gosto, pois claro que gosto. No entanto, posso perfeitamente admirá-las nas mãos das outras mulheres, há tantas: uma pessoa vai à rua e vê logo umas poucas a passar, e eu minha senhora desculpe, diz-me as horas? e aí espreito para a beleza das unhas da senhora enquanto exclamo, para disfarçar, já tão tarde? ai tenho de me despachar. Ora assim escuso eu de sofrer aquilo da seca, do "isto é uma seca". E mais, até agora ninguém se queixou do tom natural das minhas unhas e consigo fazer tudo o que preciso de fazer mantendo-me a usar unhas como as minhas (coçar o nariz, beber água, arranhar o inglês ou o francês, contar uma anedota, ler um livro magnífico, ir ao supermercado, dormir bem). Para além disso, e para compensar as pessoas que me possam achar deslavada, esquisita ou feiosa, uso anéis mesmo bonitos, até ofuscantes de tão lindos, e portanto quem quiser entreter a vista comigo, pode - nos anéis.

Na certeza de que o exposto é perfeitamente razoável, há uma outra coisa que faço muito - e vamos concluir já já - é não carregar no botão que faz acender a televisão à hora das novelas e em vez disso sentar-me ao computador a escrever parvoíces que os meus queridos leitores terão, desta vez, a amabilidade de perdoar. (é que se vissem a pilha de roupa que tenho para passar!... jesus)

37 comentários:

  1. Um post absolutamente genial para quem acabou de conhecer o blogue! É sempre bom repor verdades :) Adorei!

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    1. Mesmo com assuntos de unhas e ferro de engomar? :-) Muito obrigada, Carpe Diem!
      (olhe, e eu gosto muito desse mote, desde que vi o Clube dos Poetas Mortos, há mil anos, roubei-o para mim).
      Bem-vindo!

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  2. Susana:
    Aqui no Norte, também há quem se pele por um molho de coentros em tudo o que é servido. Não é uma falsificação do sabor, nem uma deturpação da essência, mas um toque de fantasia que abre o apetite.
    Um abraço enorme.

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    1. Minha querida mãe preocupada, nem sabe a alegria que me dá ao deixar aqui o seu comentário! E logo no post que eu achei ser o ... enfim, pior de todos. :-)
      Eu adoro coentros, mas ligo-os sempre ao Alentejo, não sei porquê. Folgo em saber que no Norte também sabem o que é bom! :-)))
      Outro abraço ainda maior.

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    2. É que vi a porta tão escancarada que não resisti a entrar. Coisas do Norte...

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    3. Ainda bem que não resistiu, como sabe, é muito bem-vinda.
      Coisas que também se passam aqui mais a Sul... :-)

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    4. Ah, folgo em saber que afinal no Sul também sabem o que é bom.... :-)
      Fora dos blogues, note-se.

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    5. De facto fora dos blogues é a gente sentar-se num restaurante na bela Lisboa e ver no menu aquilo que dá pelo nome de Francesinha. Receita muito boa para a economia familiar, uma vez que em comendo uma Francesinha à segunda feira, a pessoa já só volta a almoçar na sexta seguinte. :-)
      Quanto aos blogues, depende. Este já sabemos que é fofinho.... e isso dispensa mais palavras, creio eu.
      Resta-me pois deixar um abraço todo a cheirar bem, todo a cheirar a Lisboa...

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    6. Susana,
      Acredito que em Lisboa, comendo uma francesinha à sexta, só se volte a almoçar na segunda. No Norte, três horas depois, já cabe um molete com manteiga. Aguentamos bem e as calorias queimam-se num instante ;-)
      Vai daqui um abraço firme como o granito e quente como o xisto.

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    7. Com um abraço desses eu fico de coração amolecido, assim tipo manteiga no verão, mas... o que raio será um molete?!
      e 3 horas depois?! puxa...
      :-)


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    8. Molete é um pão, um papo seco. :) Norte. :)

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    9. Muito obrigada, Maria. :-)
      Eu nos vossos blogues aprendo muito, é por isso - por ser uma interesseira - que os visito. :-)
      Agora aprender no meu próprio... é coisa inesperada. E boa!
      Beijos às duas senhoras do Norte com carinho e um abraço também desses assim como vocês sabem dar, pronto. :-)

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  3. Querida Susana Rodrigues,
    Esta explicação para a expressão "uma seca" é genial. Aposto que tem mãos de fada.
    Boa noite,
    Outro Ente.

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    1. Querido Outro Ente, e eu fico a admirar que um homem culto - como é o seu caso - se tenha aguentado num post destes tão... de fadas do lar. :-)
      (tenho mãos muito normais, nada a assinalar)
      Obrigada e uma boa noite para si também.

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  4. A minha mãe tinha exatamente o mesmo problema (chamamos-lhe assim, embora seja claramente um exagero). Um dia, descobriu manchas de acetona na secretária do escritório; e noutro dia, na mesa da cozinha; descobriu várias até chegar à sua origem: havia umas três na escrivaninha do quarto da filha. Eu era muito descuidada com o sítio onde colocava os algodões encharcados em acetona, mas sempre tive muito jeito trabalhos manuais - é por isso que, às vezes, gosto de me achar artista. Pintar as unhas é como pintar outra coisa qualquer; e pronto: foi para trocar um pesado castigo por uma leve reprimenda que passei a pintar as unhas à minha mãe. Com tempo (e paciência) consegui disfarçar as manchas. Já toda a gente se esqueceu delas. Mas quem continua a pintar as unhas à minha mãe, sou eu.
    Onde é que eu quero chegar? É isto: as mães têm superpoderes que incluem arranjar manicuras gratuitas. Fica a dica. (E um beijinho.)

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    1. Querida S. White, em primeiro lugar isto hoje é uma festa para mim, mas que bom ter-te aqui deste lado! Em segundo lugar, o teu comentário leva-me a confessar um pecado, o que é bom, já que estamos na senda de repor verdades, eu menti. Na semana passada tive um jantar muito especial, uma pessoa da minha família fez 70 anos e deu uma baita festa. Ora a Susana lembrou-se de ir mais a condizer com uma pessoa normal e tentou pintar as unhas da mão esquerda (a mais fácil de pintar). Ao fim da terceira unha aquilo estava com muito mau aspecto e eu já a transpirar e vem a minha filha mais velha com a acetona e o algodão e a mais nova senta-se à minha frente e diz - mãe, dá cá as mãos. Ficou uma beleza, só te digo. :-)
      E outro beijinho vai daqui.

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  5. Aqui entre nós, eu também não pinto as unhas.
    Para dançar, de facto o aspirador não dá jeito nenhum. Já uma vassoura... :)

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    1. Luísa, isso é que é um quadro difícil de pintar, mas tão bom de imaginar: tu e eu, uma no sul outra a meio deste belo Portugal, a dançar com uma vassoura. Lindo. :-)
      (e é bom saber que não sou a única... deslavada)

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  6. De repente, olhei para as minhas unhas, com o verniz a descascar que isto das férias é do pior. Sim! Do pior porque a minha "ajudante de campo" também está de férias... Acho que vou ali buscar o algodão e a acetona! ;)

    Beijos, Susana. :)

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    1. Ai que não fosse estarem mis hijas tão longe, e isso era trabalho limpinho! :-)
      (qual era a cor? eu gosto de ver as cores...)

      Beijos, Maria. :-)

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    2. E não é que a Isabel é como eu, em matéria de unhas?! Até no frasco à mão para o retoque. :)

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  7. Susana, vou ser solidária contigo nisto de revelar verdades. Mas, atenção, a verdade que vou revelar, vai fazer de mim persona non grata aqui nos blogs, para sempre. Vão ler-me de lado, qualquer coisa que escreva será ignorada e nos blogs cujos comentários estão sujeitos a aprovação, não sei se voltará a ser aprovado algum comentário meu. Peço-te, se também tu, sentires uma enorme repugnância ante esta revelação, pelo menos recorda-me como uma mulher de coragem. Então aqui vai:
    Eu, Cláudia Filipa, ponho açúcar no café.
    (em minha defesa: adoro cozinhar e por mim, punha coentros em tudo)
    Embora tenha perfeita consciência de que mais nada será como antes, ainda assim, não consigo sair daqui sem me despedir como sempre, com beijinhos, Susana.

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    1. Isso não vale!!!!!!
      Eu já de lágrima no canto do olho, em aflições, ai que a Cláudia nos vai deixar e de repente..... ainda estou a limpar as lágrimas de riso, que atropelaram a do canto do olho, coitadinha.
      Pôr açúcar no café pode-se (eu própria, no início dos tempos, punha), o que não se pode é pôr café no açúcar.
      Venham daí esses ossos doces, Cláudia Filipa!

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    2. Ai aqui nos blogs foi instituído o café anti-açúcar?? (estou frita!)

      [peço desculpa por esta intromissão em conversa alheia e fora do contexto deste fabuloso texto]

      Já agora, eu pinto as unhas a mim própria e até tenho jeito ( frita novamente!)

      E adoro cores fortes ( agora já estou estorricada!)

      [é melhor sair de mansinho...]

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    3. Olá Maria!, aqui toda a gente é bem-vinda, tenha as unhas como tiver, beba café sem açúcar ou beba açúcar com gotas de café! nós gostamos é muito de brincar. E já vi que tu também. :-)
      Nada de frituras, portanto, que isso engorda e quando se tem uma nova cozinha tão bonita, já há tentações que cheguem, suponho... :-)

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  8. Por acaso o meu aspirador dança muito bem :)

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    1. Querida Loira, eu da tua família de electrodomésticos, espero tudo, até que te dance o frigorífico, tais devem ser as piruetas que dás na bicicleta da cozinha... (tens uma bicicleta na cozinha, não tens? )
      :-)

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    2. A loira tem uma bicicleta no coração!

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  9. Ahhh, que maravilha. Eu pinto as unhas de vermelho numa única estação. Na primavera. O mesmo com as unhas dos pés, mas estas conseguem aguentar mais um pouco.
    Por exemplo, agora, nem umas nem outras. Estás tudo de férias de verniz. E é um descanso.
    E também sou como a Cláudia, também ponho açúcar no café, às vezes em barda, e se quereis saber, adoro!
    Um grande abraço Su.

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    1. Uva, eu estava receosa que já não gostasses mais de mim depois disto... eu sei que aprecias uma bonita unha. :-)
      Um alívio, portanto.
      Outro grande abraço, querida Uva.

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  10. Gosto de coentros em tudo e gosto de usar as unhas pintadas. Bem pintadas. Aprecio o vermelho clássico, se é que esta cor existe.
    Dizem que me alegra. Aquando do acidente, claro que andei muito tempo só com brilho na mão boa e os amigos "reclamavam".
    Tenho muita paciência para o tempo de secagem e ando sempre com um frasquinho do mesmo tom, para retocar no caso de um ligeiro estrago. O empenho nessas tarefas é igual ao de outras quaisquer. Mas sei que posso viver sem isso. Ou melhor, eu sei claramente que posso viver sem quase nada de material.
    Beijo e bom fim-de-semana.

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    1. Isabel, são precisamente mãos como as tuas que eu gosto de admirar e me poupam completamente àquilo da seca.
      Coentros eu também, muitos. Deliciosos sempre.
      Outro beijo e bom fim-de-semana para ti também.

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  11. Passar a ferro é uma daquelas coisas que o demo arranjou só de vingança por sermos bonitas. O verniz não pinta por dentro, só se faz mostrar por fora. E afinal para que quer verniz alguém tão bonito?
    Cozinhar já gosto e modéstia à parte, safo- me bem... Gosto mais de comer, o que é uma pena... E daí, até talvez não seja.
    Beijos, Susaninha

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    1. Ah minha querida M D, eu também gosto de comer e isso é bom, embora exija um certo auto-controlo, evidentemente.
      E sim, de facto quando somos lindíssimas não precisamos de verniz. :-))) Mas a roupa, essa, continua a sair amachucada da máquina de lavar. Bolas.
      Mais beijos, M D.

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  12. Eu não pinto e ainda me dedico à arte de roer... Um primor!

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    1. Olá Ana :-)
      Se é uma arte, então força nisso! Quem sabe lanças a próxima temporada outono-inverno para unhas?! :-)

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