Lavo as mãos e sento-me à secretária para continuar o trabalho.
A caldeirada de pota do almoço libertou vapores aromáticos típicos que parece que vieram
comigo. Concentro-me, calculo que isto já passa e o resto, que também calculo, não
dá zero.
Despacho-me, há que estar pronta para a reunião das três, já sei como é. Isto feito tem de ficar e eu tenho de ir.
Enquanto teclo os cálculos, o zircónio que me brilha no dedo
brilha-me no dedo. É a receita da primeira hora da tarde, a hora morta, pesada,
fastidiosa, estica o dia para dentro de um bocejo muito comprido, espreguiço-me,
vou mostrar.
(coisa tão linda)
Continua a cheirar a caldeirada de pota, mas eu lavei as
mãos.
À minha esquerda, pendurada na parede, está uma das minhas
obras de arte favoritas, para não dizer uma das minhas paixões, a obra que
contém mais beleza, mais ciência, mais técnica, estudo e dedicação, um trabalho
de uma grande equipa a tempos diferentes, uma pérola ainda incompleta, uma estrela: a
tabela periódica dos elementos.
(pausa para sorrisos rasgados e inclinações amorosas de
cabeças visivelmente enternecidas e um café se for rápido)
O zircónio elegantemente exibido ali em cima também está no
retrato, tem o número quarenta, e portanto não resisto e levo o dedo ao papel, toco no quadrado onde mora
o zirconiozinho que bonito e que cheiro a caldeirada.
Admiro o brilho desta pedra preciosa, hipnotiza-me
ligeiramente, uma riqueza que me faz revirar a mão, inclinar de novo a cabeça
em enternecimento já referido, esquecer por um bocado os cálculos do resto que não
é zero antes que a reunião comece e ver melhor.
Ver melhor e bastante bem a grande mancha amarela muito suspeita com ramificações transversais nos dois sentidos, estrutura
ligeiramente fractal, impressa na manga da minha
bata de trabalho que não tirei para ir à cantina, visto que me fica tão bem.
(Isto é o que acontece
quando tento escrever um post pequeno, curto, rapidez no consumo que há mais
que fazer. O que demorou imenso foi a fotografia)
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