a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

20/05/2015

Bolas verdes grandes e pequenas no sofá da mãe

A minha irmã acho que é muito fofinha, tem caracóis que saltam mesmo quando ela chora porque não chega ao aquário. Ela quer tirar o peixinho cor de laranja para brincar com ele e com o teletubie encarnado. O meu teletubie é amarelo e eu sou crescida. Os peixes só na água conseguem respirar, coitadinhos.
Hoje a mana foi buscar uma caneta de pintar verde e a mãe não viu. Não chorou com o braço esticado para o aquário que está na mesa alta, nem fez barulho nenhum. Eu pensava que ela ia fazer um desenho, mas não deve ter encontrado as folhas e eu fui fazer xixi, estava mesmo aflitinha.
Voltei à sala a correr depois de puxar o autoclismo e abrir a torneira para a mãe pensar que lavei as mãos. A mana já tinha feito o desenho no sofá que é branco e azul com riscas, eu acho este sofá mais giro que o outro todo azul, e ela também porque fez o desenho neste.
A minha mãe já estava a ver o sofá todo riscado com muitas bolas pequenas dentro das grandes todas verdes e nem estavam muito mal feitas, acho que a minha irmã tem jeito e fiquei admirada de a mãe não achar isso também e lembrar-se que ela ainda é pequenina. Eu é que sou crescida.
O teletubie encarnado estava deitado no chão perto do sofá e a mãe em pé a ralhar muito com a mana que tinha a cara virada para o chão e não se mexia e a caneta até caiu da mão dela. Pensei que ela podia morrer porque a mãe estava muito zangada e parecia que gostava mais do sofá do que da mana, mas isso eu não acredito, se calhar a mãe estava mal disposta e não reparou que as bolas verdes até estavam mais ou menos.
Para a minha irmã não morrer, eu fui para trás dela e fiz-lhe festinhas nas costas sem a mãe ver. A mana não chorou e estava a respirar, porque os ombros dela mexiam e eu é que estava quase a chorar com medo.
Quando a mãe se calou e se virou de repente e foi muito depressa para o quarto, apanhei o teletubie encarnado do chão e dei-o à minha irmã.



Eram assim no verão de 2002.

8 comentários:

  1. Lindas!!
    Susana, deixa-me perguntar-te: como tiveste acesso a este texto da mais velha? Ela era (ainda é?) reveladora duma grande sensibilidade e instinto protector. Fantástico!

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    1. Querida Pseudo, quem escreveu fui eu. Tentei pôr-me na cabeça dela a contar o episódio (quando aconteceu ela ainda não sabia escrever). Ela era assim, de facto, muito protectora da irmã (e ainda é).

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  2. Um texto lindo e uma fotografia tão amorosa :)

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  3. Ia fazer a mesma pergunta que a Pseudo mas fiquei esclarecido com a resposta.
    Um texto bem consebido e melhor conseguido.
    Abraço

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    1. Olá Observador, que bom vê-lo por aqui! Muito obrigada pelo gentil comentário.
      Abraço de volta.

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  4. Lindas, a manas! Linda, a forma como recordas a relação entre as duas, mesmo pequeninas!

    Um beijo, Susana. :)

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    1. Este episódio em que eu ralhava com uma e a outra fazia-lhe festas nas costas a consolá-la, muito juntinha à irmã para eu não ver, acabou comigo a virar-me de costas para elas não me verem rir. :-) às vezes era difícil ralhar.
      Um beijo, Maria, e muito obrigada pelo carinho.

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