a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

15/03/2016

As mãos como os pombos

De manhã, junto à consola da entrada, veio uma grande tontura apanhar-me os pés. Sem a esperar, vi-a subir-me à cabeça. Aí, fez uma espiral funda em duas voltas que me escureceram os olhos por dentro a velocidade constante. Depois continuou, desenrolando-se em duas e tomando por meus braços fora; a grande tontura cortou-me a meta nas mãos. Ágeis como os pombos, agarraram de pronto, em uníssono, a consola da entrada que, simultaneamente, não caiu.

Só depois abrandei. O semáforo espera-nos vermelho e do outro lado, mais perto do rio, os pombos debicam no alcatrão. São quatro ou cinco dispostos pela via, não sei se pedrinhas se pedaços de pão. E quando o vermelho se faz verde e os carros largam piso acima, os pombos, ágeis como as minhas mãos, levantam voo a tempo inteiro.