a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

27/04/2023

O verso (sem meta por favor)

Hoje é noite de Maydays no canal National Geographic. Instalei-me toda no sofá para a sessão de aprendizagem, mas os episódios são repetidos (ainda bem). Volto-me então para este pequeno e levezinho blogue, ao contrário de mim. 
Não comi cebolas inteiras com casca, nem bebi a cerveja por uma palhinha azul de plástico. Não continuei a ouvir a entrevista à Susana Peralta depois de ela dizer um disparate do tamanho de um elefante montado numa girafa. Não fui para o trabalho a pé nem não fiz o exercício de sete minutos no quarto.
Não aprecio as declarações do que não se é. Pelo contrário.

25/04/2023

Feira popular

Acabei finalmente “Os irmãos Karamázov” de Dostoiévski, primeira parte. Falta a segunda, que é maiorzinha. Mas vai ficar para depois. “Os irmãos Karamázov” é uma obra muito muito à Dostoiévski, maravilhosa e densíssima. Algumas passagens de filosofia sobre a religião aborreceram-me imenso, mas não saltei nada. O problema é meu, uma vez que também tenho a minha dose de feira popular e anúncios de televisão. Peguei, entretanto, em mais um da Clara Pinto Correia, não sei quê dos caminhos. Os livros dela têm títulos ocos que nem eu memorizo com facilidade e capas muito feias, mas são tão bons.

22/04/2023

Pão sem manteiga

Quando, pouco passava das seis horas, o dispositivo retangular a que chamo telemóvel (senhores, arranjar nova designação) me caiu na cara dando-me o flanco lateral, nem a capinha transparente, flexível e algo amortecedora, comprada no chinês de Penela, me aliviou a dor no osso facial. Normalmente este género de quedas próprias das leituras matinais na caminha são muito menos acutilantes.

Mas acabei de ler o artigo do Expresso, li outros dois do Página Um (hoje o Tiago Franco desiludiu-me um bocado ali no remate final), e levantei-me. Pela janela via-se que a noite já tinha saído, mas o dia ainda estava a tentar emergir das nuvens. Vesti o grosso robe de chambre cor de fumo e fiz-me à escada. Na cozinha preparei um café de filtro e meio pãozinho de ontem. Torrei-o ligeiramente e meti-lhe dentro uma elegante fatia de queijo light. Manteiga nem pensar, evidentemente. Lá fora sei que está frio. Abro o trinco devagar, prolongando o estalido para não espantar algum veado que pudesse andar por ali a alimentar-se de erva fresca e saio para o terraço. O ar está carregado de humidade e as cadeiras ainda estão molhadas. Veados não se vê nenhum, devia ter vindo mais cedo. Passo os olhos pelo vale envolto em neblina onde os pássaros chilreiam à falta de primavera. A minha rica ideia de tomar ali o café da manhã desvaneceu-se para dentro. Torno a fechar a porta devagar. Ao subir a escada, noto que, agarrado ao vidro da janela alta, do lado de fora, está um grande caracol de antenas no ar seguindo direitinho na vertical, muito lentamente.

01/04/2023

Notas a mil

Gosto do podcast A beleza das pequenas coisas, tirando quando o convidado ou convidada se anima de uma atitude especial muito séria e pausada voltada para si mesmo ou mesma, no entanto vale sempre pelo riso magnífico do Bernardo Mendonça.
Voltei a ver Mayday, desastres aéreos. É a única coisa que vejo na televisão, à exceção das notícias e o RAP ao domingo. Não sou maluquinha, aquele programa é que é muito completo, tem técnica, psicologia e comunicação quando não também questões culturais.
Finalmente consegui comprar calças jeans que têm a cintura no lugar certo em vez de nos ombros e o fim das calças nos pés em vez de a meio caminho da perna. Sinto-me muito melhor, até sou capaz de amanhã ir passear a sítios bonitos com elas. 
A conferência de há dias deixou-me tensa tanto tempo ao microfone que ainda me doem músculos principalmente nas costas. 
Fiz uma brevíssima e ridícula incursão no tuiter para experimentar. Visualmente, o ecrã fica poluído com lixo que atrapalha a leitura das duas ou três pessoas que me interessaram. Não. A vida quer ir mais calma e a primavera já começou.