a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

17/04/2024

Boa viagem, disse ela

Então como está Fátima, não perguntam vocês. (estou a fingir que isto é uma rede social das normais) 
Fátima está na mesma, não parecem passar os dias por ela. Nem os meses, tirando o do Natal, evidentemente. O Burger King informa-nos que é desde mil novecentos e cinquenta e quatro - e a gente acredita - numa iluminação em branco puro mas que lembra os cafés de estrada americanos. Aqueles dos filmes em que as portas têm sempre algum penduricalho que fica a tilintar, vocês percebem. (não me esqueci que estamos a brincar às redes) 
Já a loja de vestidos de noite está fechada, bem como o restaurante Viva Maria e a Clinica Dentaria Sorriso Branquinho. Podemos então especificar, sem medo, que Fátima repousa em paz e em toda a sua extensão de, segundo pude apurar, setenta e um vírgula vinte e nove quilómetros quadrados. Nada mal, sim Senhora.

Agora não sei se vou ter likes, mas acho que não dá para tanto. Portanto se gostaram da minha publicação, paciência, podem ficar aí sem fazer nada, sossegadinhos a repousar dentro de toda essa beleza própria.

(mas obrigada por estarem aí, consegui distrair-me da baratinha que se passeava no chão do autocarro no sentido de trás para a frente, em Fátima, em Fátima, só não tiro foto porque a barata fugiu do meu campo de visão além de que também vou um bocado enjoada) 

10/04/2024

Pensei pintar de azul (mas só pensei)

Enquanto lá fora anoitece devagarinho, as pessoas entram no autocarro e instalam-se. Olham para cima, focando o rebordo da prateleira para a bagagem leve, e consultam o número atribuído ao lugar. Algumas duvidam, outras enganam-se, poucas perguntam. Estamos em Portugal, mas muitos são estrangeiros. Espanhois, brasileiros, russos ou talvez ucranianos. O azul cinza do céu esvai-se num rosa escarlate ao meu lado direito. Como se lhe doesse morrer o dia. Saímos por fim com catorze minutos de atraso. Mas nesta rota é normal, não sei porquê. A mulher de cabelo pintado de roxo vai sentada do outro lado da coxia e prepara-se para dormir. Sei isso porque enfiada no seu braço vinha a entrar uma almofada em forma de C da mesma cor do cabelo. Assim, toda combinada, a mulher de cabelo roxo vai dormir um soninho bem bom. Aposto.