a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

18/03/2018

As notas e a música é mesmo um fluido

E desejas, como desejas, ter um dia de descanso, um todo, um em que não trabalhes nem uma letra nem um copo sujo, uma espinha de peixe caída ao chão, uma toalha por dobrar, nada. Pensas que aí podias mitigar isto, este aperto na garganta que vais reprimir outra vez, claro. Lágrimas não as queres por causa de ver, que com elas caindo não vês o trabalho e a verdade tem de middle name "who cares?" incluindo o ponto de interrogação, tal como já sabias. Manténs os olhos secos que é uma beleza, pega no lencinho, pega, aperta-os bem que eles aguentam-se. E então vais e pelo sim pelo não tomas um intervalo para chá. No armário encontras a caixa do sabor a maçã e canela e é nessa que pegas. Depois, enquanto o saquinho se ajeita na água que ferveu num instante, olhas os jacintos que já floriram. São os jacintos do vasinho que cuidaste comprar para ti, nem sabias a cor deles por virem fechados num verde imberbe mas uns dias depois oh! são rosa os jacintos! Portanto enquanto o chá se solve e não solve vais dar uma cheiradinha neles, não vais? são teus, hum! que odor estes jacintos!
E de volta ao trabalho de chá na mão, estás de novo rija que nem um pero, mas eis que notas a música. Pousas o chá. Não, isto é notas que não escolheste. A música aspira-te qualquer coisa e já esqueceste o rija que nem um pero e o lenço que aperta os olhos em cima da mesa, já amoleces por partes. A música ganha. Tu perdes e finalmente choras também.



(Stephen Hawking experimentou morrer, em tempos, deixando de respirar. Não conseguiu porque o reflexo da respiração foi mais forte. Ainda bem.)