a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

07/04/2014

As meias

Veio escarrapachar-se à minha frente.

Ali, mesmo do outro lado da rua, naquele suporte vertical com moldura metálica acastanhada. O suporte de outdoor está à chuva mas isso não impede os anúncios impressos em papel de grandes dimensões de deslizarem por detrás do vidro pingado, à vez. Ora sobe um ora sobe outro e na volta descem todos, uma organização tri-partida.

Um é o novo Audi que não sei quê, não deu tempo de ler, desliza na vertical ascendente e vem o outro que é também um Audi mas que fica mais em conta, a Audi anda a esforçar-se, está visto. São ambos brancos, os carros (o branco está na moda no que toca aos automóveis).

Mas o terceiro anúncio é que me fez saltar um bocadinho dentro do meu carro que está parado, não tem tido deslizes e é preto: Sei Lá, o filme???

Olha olha, querem ver que enquanto a Audi se esmerou para mostrar os seus carros novos, um virado com a frente direita, o outro a dar a lateral esquerda, andava o pessoal das produções a fazer um filme do livro da Margarida Rebelo Pinto?!? Mau.

Se foi este o livro que li dela, lembro-me apenas de uma cena. Do resto ficou o vazio.

A mulher enfadou-se do homem com quem tinha dormido por causa das meias azuis escuras no chão do quarto. Imaginou-se esta mulher, se bem creio, a encontrar meias desta cor pelo chão, todos os dias da sua vida, na saúde e na doença, até que a morte lhe leve as meias. E a cor.

E agora sai um filme sobre isto.

Acho bem. Sempre é um dinheirito que poupo.

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