a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

14/04/2020

Um post por dia até ao fim do Corona - 30

Hoje cometi uma loucura. Quer dizer, duas. Tirei a máscara da gaveta e desci para a garagem. Despertei o carro do sono prolongado e ativei o navegador do dispositivo inteligente para me guiar ao local. Vou levantar um bem da categoria bens-e-serviços que adquiri ontem em linha (prefiro evitar estrangeirismos por poluírem o texto que já de si não nasceu assim tão lindo) na loja respetiva. Tirei o carro da garagem e fui, indo. Passei ao lado do parqueamento dos aviões onde estavam muitos, muitos, mas desviei o olhar. Continuei como se fosse o dispositivo inteligente que embora o sendo não desconfia dos aviões naqueles propósitos. Continuei indo. Quando cheguei ao destino, uma considerável zona comercial, procurei, sem sair do carro, a porta de que me queria servir. Mas não a encontrei na primeira ronda pelo parqueamento, este de automóveis, não muitos, poucos. Vi um homem ao fundo e, embora mascarada, parei junto dele, abri a janela e, gritando muito alto para superar a almofada em frente da boca mais os metros que se interpunham, perguntei pela minha porta querida. Ele aproximou-se um nadinha e deu indicação detalhada. Tem de ir, a pé, mesmo dentro da loja, tinha ele dito. Aquilo que antes era óbvio, fácil, imediato, agora está turvo, duvidoso, longe. Subi o tapete rolante em direção à loja querida. Havia algumas pessoas dispersas, em linha, mascaradas na sua maioria, aguardando vez. E então vejo a outra lojinha, ai jesus. Era uma lojinha de vender café e bolos, pastéis e sumos. Estava meio fechada e meio aberta. Tinha um papel afixado na parte meio fechada anunciando a parte meio aberta: café havia, desde que para levar. Sentar é que não. Fitas de plástico trancavam o espaço em volta, avisando melhor. Perguntei à única empregada, mais uma vez com voz aumentada, se podia comprar um café, só para prolongar a expectativa. Pode, pode, mas tem de ser para levar. Paguei com dinheiro. Aceitei o copo de plástico superando a parte do plástico com o café a fumegar, meu bem querido. Olhei para a minha filha que também veio mas tem estado caladinha. Ela ri-se com os olhos, divertida, e diz com a voz abafada, rápida e esforçada, tens de tirar a máscara, mãe! Foi mesmo a tempo, o meu ímpeto estava tal que por um triz não ia o café com máscara e tudo.

14 comentários:

  1. Isto de andar com máscara não vai ser fácil. Resolvi fazer uma com um resto de pano que cá tinha, cosida à mão e tudo, que a máquina de costura avariou há muito e nem jeito tenho para a coisa. É para usar quando me abasteço de víveres no supermercado e já usei, mas nem eu,nem os meus óculos apreciaram a experiência. :)

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    1. Muito bem, Luísa. Eu comprei na farmácia estas que entraram no post a 7,75 euros cada uma! Temos mesmo que as fazer em casa, ai temos temos.
      :-)

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  2. Ahahaahahahaah. Chegado ao fim ri com gosto. É que ontem ia-me acontecendo a mesma coisa. Café em copo de plástico e lá vai para a boca. Ups... faltava um milímetro. Sorte mesmo. E só fui comprar um saco de pão integral ao continente. Depois de 25 minutos na fila... mas... depois do café...

    Uma Santa noite

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    1. Assim já fico mais descansada - afinal o "problema" é geral.
      Um bom resto de dia, Ricardo.

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  3. É verdade, por mais café que se tome em casa, mesmo com qualidade, nada se equipara a um expresso bem tirado com a goma a sorrir para nós e a equilibrar o açúcar de quem o põe.
    Quanto às máscaras, um suplício para quem usa óculos.

    Boa noite

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    1. Fazendo as contas, acho que nunca na minha vida tinha estado tanto tempo sem beber um café fora de casa desde os primórdios em que comecei a beber café, tinha para aí uns 17 anos. :-)
      Boa tarde, nn :-)

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  4. ehehehehe, muito bom, também nã a tiro quando estou na rua, mas já percebi que nã consigo usar óculos... temos de inventar uma forma... e que dê para tomar café :)

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    1. Isso dos óculos é que é pior... eu não uso óculos na rua (só escuros) e por isso não senti o efeito embaciamento, sou uma sortuda.

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  5. Hahahhahha, dá para rir ao menos. Acontece a muito boa gente! :))
    -
    Segue o meu imaginário ...
    -
    Beijos e um excelente dia!
    "Protejam-se"

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    1. Ainda que deu para rir, Cidália :-)
      Um beijinho e um ótimo resto de dia.

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  6. Os óculos são protectores, não os tirem, pelo contrário. Mas quando chegarem a casa lavem-nos bem. Até há vídeos de quem faz máscaras usando os próprios óculos. Café: sempre gostei mais do de casa, mas agora, que diabo...que saudades tenho de um de rua.
    ~CC~

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    1. Eu também gosto muito do café de casa, e por isso não esperava sentir assim tanto a falta de um café "a sério". (as coisas que a gente aprende, hein?)

      Beijinho, CC.

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  7. Sabes que de todas as alterações que isto tem tido nas nossas vidas, essa coisa da máscara, eu que ando a fazer tudo como têm mandado fazer desde o inicio, tive sempre uma resistência a essa coisa da máscara. Agora, será inevitável, mas é tão, parece mesmo o culminar da estranheza absoluta, sabes? Não estou a conseguir explicar melhor. Mas, também acabei o teu post a rir divertida, e, como não estou de máscara, com os olhos e não só.

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  8. E onde andam as máscaras? Estão todas esgotadas!

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