a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

31/12/2020

O gato

O poema começa com Chove nas árvores nos gatos* que desta vez não me deu jeito nenhum ter trazido à memória seguinte a mais uma noite curta o gato magoado. Estava ontem alegre a dispor as cadeiras ao sol do terraço para daquele absorverem o poder quentinho. As cadeiras, varri delas os restos de estarem guardadas no escuro dos encaixes, e também do chão as folhas que haviam chegado no dia anterior. Então vi o gato sair do esconderijo onde se refugiava do mundo e de mim, avaliando mal as intenções da minha vassoura. Saiu a miar e saltou para o terreno em baixo afastando-se tão rápido quanto podia. Levava o pêlo encharcado desde as orelhas à ponta da cauda e coxeava. Não pude salvá-lo de nada, fiquei a vê-lo ir miando infeliz. Desde aí parece que choro escondida, por dentro. Dói-me a dor dos gatos. A dor dos animais todos. Também dos quinhentos e quarenta animais mortos por homens deprimentes, ínfimos de cabeça, zeros de coração. Zeros. 

* "Hotéis decadentes que atendem no Inverno" , in Movimento, João Luís Barreto Guimarães 

4 comentários:

  1. Passando, lendo, elogiando e deixando votos de um
    .
    Feliz Ano Novo de 2021
    Saudações poéticas.

    ResponderEliminar
  2. Como a compreendo. Doí-me tanto as dores dos bichos.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Ontem estive a ver um documentário sobre o lixo nos oceanos. Há aves marinhas que não conseguem levantar voo com o peso do plástico no estômago, há baleias a ingerir quantidades de plástico que as sufocam. Baleias!
      Nós somos de um egoísmo absurdo, nós homens e mulheres.
      Um beijinho, ana, e bom fim-de-semana.

      Eliminar