a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

07/06/2022

À saída do escritório (a meias)

Ao fim da tarde meti-me na casa de banho para fazer a troca. Remover os sapatos em princípio elegantes pelos sapatos de ténis com meias. Meias, quer dizer, aquelazinhas que se ficam por vestir o pé e espreitar uns milímetros acima do gargalo do sapato. Não sou amiga delas por causa da sua mania de descaírem até aos dedos dos pés logo ali ao passo número trinta e quatro ou trinta e cinco. Irrita uma pessoa, mas é a moda. Nem nas lojas se encontra outra coisa. Só na loja do chinês, imune a caprichos mercantis, se consegue comprar meias normais das boas que ficam no sítio nem que a gente faça dez mil passos muito largos. Nunca percebi que mal têm essas meias para terem sido barbaramente substituídas por aquelazinhas que não sabem o que é um tornozelo com frio, mas quem sou eu. Então hoje resolvi suspirar fundo e utilizar com fé renovada o único parzinho que escapou à limpeza de há uns meses quando tirei da gaveta esses erros que cometera e deitei tudo no caixote do lixo. Tudo o que sobrava, na verdade. Metade delas já tinham perdido os pares algures entre o tambor da máquina de lavar e as paredes que lhe sustentam as voltas da centrifugação, de tão minúsculas. E isto hoje porquê? Porque ontem a Saminhas me garantiu que ficava mesmo horrível usar os sapatos de ténis para o caminho até ao escritório com um par das meias subidas como eu gosto de vestir o tornozelo. Ó mãe, isso fica horrível, ouvi eu pela manhã. Ora venho então eu hoje a sair do trabalho já com aquelazinhas nos pés quando a Joana passa por mim, apressada. Vou apanhar o comboio, explica-me. Eu acelero para a acompanhar, logo esquecida do resultado que aquilo pode dar dentro dos meus sapatos de ténis. Descemos as escadas juntas e notei que também ela já havia feito a troca: dos sapatos de salto pela sua própria versão de ténis mais meias. Ambas preparadas para enfrentar a calçada lisboeta com os seus interstícios, ângulos vivos e miniplanos inclinados em todas as direções, uns polidos outros não, às seis e tal da tarde, sim sim. Descobrimos que vamos para o mesmo lado da rua. Faltavam alguns minutos para a hora do seu comboio. Onde moras, Joana, perguntei. Ela respondeu, enquanto olhava para o relógio e apressava mais o passo. Eu também, ainda que sem comboio para apanhar, metro ou autocarro. Tão só a alegria renovada de ter de novo colegas com quem fazer os caminhos para casa. Se não inteiros, pelo menos a meias. Mesmo que daquelazinhas.

6 comentários:

  1. Olá
    Detesto essa meias! Já comprei de todas as marcas e feitios, com silicone.. que agarram melhor, dizem eles...ah, ah
    O resultado é sempre o mesmo. Ao fim de 10 passos lá estão elas todas enrodilhadas no meio do pé.
    E a parte do pé que queria em teoria proteger ( tenho uns pés um pouco "mariquinhas") a roçar nos ténis e a fazer bolhas.
    Porcaria de meias....

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    1. Pois é, ana, então já somos duas... :-) (é bom saber que não estou só nesta coisa das meias)
      Bom feriado e fim-de-semana etc.

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  2. Disparei a sorrir logo ali "acima do gargalo do sapato" e é ainda nesse estado que te digo, concordo com Saminhas, no caso de qualquer peça de vestuário que permita que vejamos esse aconchegar de tornozelos. Também acho horrível, pelo menos em mim detesto ver, assim mesmo ao nível de um altamente horrível (com saias, calções, calças curtas...), já com quaisquer calças que, a não ser que estejamos sentados, tapam os tornozelos, não vejo qualquer violência estética nesse aconchegar e uso e abuso dele.
    Há umazinhas que apertam ligeiramente no contorno de seus finalmentes tendo por objectivo, precisamente, evitar esse escorregar tremendamente desconfortável, e, sim, devo dizer que se aguentam muito bem...

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    1. Mas sabes, Cláudia, que no caso de um homem de fato e sapatos de atacadores, acho muito inestético aquilo da meiazinha a desaparecer dentro do sapato e o tornozelo à mostra. Aí devia mesmo - para o meu gosto, claro - ser uma meia soquete das boas a meter-se dentro das calças, devia devia.
      Essas do aperto do contorno eu não experimentei, mas acho que a minha máquina de lavar já deve estar enjoada de comer tanta meia-meia e por isso, olha, ficamos assim... :-)
      Bons feriados, fim-de-semana and so on!

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    2. Ah, sim, no caso de um homem de fato e sapatos de atacadores (e mesmo outro sapato qualquer) e no nosso caso, que também temos a nossa versão bem gira fato com calças e sapatos de atacadores, também acho muito inestético isso da meiazinha a desaparecer... (um dos exemplos que me veio à cabeça quando falei das calças que só não tapam quando estamos sentados, e, nesse caso, não faz mal nenhum, muito pelo contrário, também para mim, ver-se uma meia e não uma meiazinha...
      ... and so on também para ti, Susana! :-)

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    3. Exato! A minha sorte é preferir calças compridas (mesmo) e a alargar um bocado para baixo em vez de terminarem em tubinho justo. Pronto, sou mesmo agarrada a modas anteriores, é um facto :-)
      Besos, Cláudia!

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