a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

05/08/2019

Tesouros

Em cima da mesa do café, na esplanada da praça para a qual deita o Hotel de Ville em Hendaye, os cubos de açúcar de cana, embalados individualmente, sobram, indiferentes, dos cafés tomados em paz. Lembram-me, em oposição, a vida no gueto de Varsóvia cujo pedaço de história terminei há pouco de ler.
Aqui, neste princípio de tarde de verão, húmido e quente, farto, pardais gordos debicando pelas mesas migalhas demais, aqui onde estacionam carros potentes e as crianças se vestem de igual, onde se afixam cartazes anunciando concertos de verão e os menus escritos a giz se impõem num estar pitoresco, aqui quatro cubos de açúcar são nada. Lá, num ido inverno polaco igual ao inferno, criogenado, o ódio por menu do dia, a morte por certa, há quase oitenta anos, lá, foram os cubos de açúcar tesouros.

2 comentários:

  1. Sim, num Inverno Polaco, lá atrás e a não esquecer. Mas também ainda hoje em muitos cantos esquecidos deste nosso mundo. Obrigada Susana por nos lembrar como somos afortunados.
    ~CC~

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    1. Eu também me sinto afortunada por conhecer uma pessoa tão bonita e construtiva como a CC. Acho-a admirável, querida CC.

      Muito obrigada pelo seu comentário.

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