a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

19/07/2025

Das manhãs é um titulozinho

Sou naturalmente das manhãs. 
As insónias saíram, o café pronto para se fazer ao dia, os pássaros despertando da lua, as ameixas frescas penduradas na árvore. 
Porque os cruzeiros aborrecidos, carregados de fugas (ao fisco), à vidinha, cruzam outros mares lisos, completamente pobres. Como se fossem noites. 
Eu sou das manhãs. 
Por exemplo, o autocarro começando a viagem um bocadinho vazio: bom dia ao mesmo tempo que alças a perna, que ouves a máquina fazer plim, que agarras depressa o varão.

Das noites pretas que não se apagam sou nada, a cabeça insuflada de ruídos, de ocos, de espessos, de grudentos. Nem um bom gato dali me salva. É de noite que morrerei, parece. Numa que ainda não se formou, não se agitou, não estendeu as suas garras podres todas cheias de escuro (não há pressa). 
Mas o corte fundo levado a cabo no meu dedo pela faca verde obtida nas compras do minipreço já sarou. 
Então vamos seguindo com esta escrita de tapinhas digitais no vidro dentro do autocarro, de uma manhã. (A marota a chocalhar-me o corpo para os lados nas curvas!) 

Quero que este verão fique assim para sempre, a inchar de manhãs. 

Sem comentários:

Enviar um comentário