a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

24/03/2020

Um post por dia até ao fim do Corona - 9

Pieter De Hooch - Pintor holandês
(n. 20 de dezembro de 1629, Roterdão; m. 24 de março de 1684, Amesterdão)

Mensagem que fotografei ao lado do quadro acima, no Museu Rijks em Amesterdão, em maio de 2014. A tradução é minha e feita um bocadinho à pressa:

"Pode ser difícil ver beleza e interesse nas coisas que temos de fazer todos os dias e nos ambientes em que vivemos. Temos de ir para os empregos, pagar as contas, limpar as casas e mantê-las a funcionar e ressentimo-nos profundamente do que exigem de nós. Parecem desviar-nos das nossas ambições reais, de conseguirmos uma vida melhor. Achamos que a arte e as galerias de arte estão longe de tudo isto: são para um dia livre, para as férias.
O próprio armário da roupa de casa podia facilmente ficar ressentido. É uma materialização do que poderia, em circunstâncias desfavoráveis, ser visto como aborrecido, banal, repetitivo – mesmo nada sexy. Mas a imagem toca-nos porque reconhecemos a verdade da sua mensagem. Se ao menos pudéssemos, como De Hooch, saber reconhecer o valor da rotina diária, aliviar-nos-íamos de muitos dos nossos fardos. Ele dá voz à atitude certa: os grandes temas da vida – a procura de prosperidade, felicidade, bons relacionamentos – estão sempre fundados na forma como encaramos as pequenas coisas. A estátua por cima da porta é uma pista. Ela representa dinheiro, amor, estatuto, vigor, aventura. Cuidar da roupa de casa (e tudo o que isso representa) não é incompatível com estas esperanças grandiosas. Pelo contrário, é o caminho para elas. Podemos aprender a ver quão fascinantes são aqueles que cuidam das pequenas coisas, de nós inclusivamente.
Esta é uma mensagem à qual dificilmente aderimos, porque nos ensinam constantemente outra coisa. Este quadro é pequeno num mundo grande e barulhento – mas o facto de tantas pessoas o apreciarem traz esperança; significa que sabemos, no fundo sabemos, que o que De Hooch estava a querer dizer é importante.
Doença
O trabalho vulgar é de escravo.
Eu quero é aparecer na televisão."

4 comentários:

  1. Gostei muito deste texto, Susana. Eu, que dou uma importância de tamanhão às pequenas coisas, gostei de saber que, afinal, pode não ser tolo ou descabido, e mesmo que goste, também eu, de 'aparecer' na televisão.

    Beijinhos

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    1. Por isso é que, no teu blogue, nos sentimos num lugar real, honesto, amigo. Não tem nada de tolo ou descabido, Gina. Muito pelo contrário.

      O meu único problema com o teu blogue é não ter hipótese de o ler todo... :-) o que espero que me perdoes.
      Se, nestes tempos estranhos, o meu trabalho ficar afetado e eu passar a ter tempo livre, então outro galo cantará, como diz o povo.
      Um beijinho e um abraço apertado. :-)

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  2. Gostei muito do texto. E apropriado aos tempos que correm

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