a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

11/07/2019

Estupe, por favor

Houve uma hora em que pus a cabeça descansando nas mãos, os cotovelos apoiados na mesa nova, tão bonita, e senti que agora era estupe, quero estupe.

***
- Rodrigo, o que diz ali naquelas letras pretas?
- Diz... en...tra...da. Entrada!

O meu sobrinho mais novo passou para o segundo ano e já sabe ler muito bem, segundo o próprio, embora não tudo tudo. Há palavras difíceis, tia!

Fizemos o percurso de ida e volta na telecabine. Vimos uma alforreca deitada na água. Vimos cardumes de peixes. Pretos, disse a Maria. Uns grandes, outros pequenos. Cinzentos, corrigiu o Rodrigo. Os peixes são cinzentos! Vimos as árvores de cima e as casinhas dos gelados. Vimos um fumo a subir, ao fundo. Seria talvez fogo. Falámos sobre o nome deste rio, o Tejo, e de outros dois, o Douro e o Mondego.

No fim da volta, a telecabine devolvendo-nos a terra firme, tornei

- E ali naquelas letras o que diz?
- Saí...da. Primeiro era entrada e agora saída!

Ao subirmos no elevador do prédio, já recolhendo a casa, não precisei de lhe perguntar o que podia ler ali, o Rodrigo adiantou-se: estupe, leu, junto ao botão de stop do elevador.

***
Então, tirei a cabeça das mãos sacudindo a vergonha e fui abrir a porta ao pequeno novo probleminha.

Estupe, realmente, não existe. Não está nas minhas mãos.

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