Quando saio de casa para ir ao supermercado comprar uma coisita
ou duas meto, à saída do prédio, a chave de casa no bolso a título de a ter bem
acessível quando, dentro de alguns minutos, regressar com sacos de compras invariavelmente
mais pesados do que inicialmente previsto, evitando pois a mim própria a
demorada busca com a mão feita livre à custa de a outra agarrar mais peso, uma
busca (louca), dizia, dentro da minha mala de mão (e daí com certeza o nome). Digo louca
por ser esta busca acompanhada de pensamentos tais como um-dia-destes-enquanto-lavo-as-costas-engendro-uma-forma-de-abrir-as-portas-todas-com-a-minha-voz-ou-o-meu-olhar
raios partam as chaves. E só depois, quando já não aguento a posição de torta e carregada em busca da chave perdida nos fundos da mala (de mão, realmente) e pouso,
vencida, os sacos no chão me lembro do bolso. A chave está no bolso! Para te
facilitar a vida, não foi? Foi! E depois até costumo esquecer-me ato-contínuo do
sucedido, perdoo-me a histerese, no máximo sai-me um suspiro. Só que é sempre
assim. Por isso hoje, enquanto subia as escadas com os sacos nas mãos fintando o
elevador para fazer o exercício, disse aos meus botões que ia contar isto ao blogue. Disse disse.
(mas vem isto exatamente porquê? porque a minha filha Muzi, quando esteve fora por vários meses,
vinha cá ler o blogue para matar saudades, contou-me depois, e os posts de que mais
gostava eram os que davam notícias do papagaio - eis porquê)
(já em casa, enquanto meto as uvas no frigorífico, oiço, pela
janela aberta, as cigarras fazendo imenso barulho ao calor, tanto que se nota
no papagaio, sobressaindo-lhes a custo com aquela conversa a que já nos habituou,
uma certa rouquidão, coitadinho)