Não me sai da cabeça, a cena, não sai. Anda a meter-se nos meus pensares, uma, duas vezes por dia, talvez mais.
Foi assim.
Era a hora de fazer o jantar e ter a televisão da cozinha ligada, a passar as notícias. Para lá não olho muito, é mais ouvir, mas quando vinha da despensa com a pimenta na mão e me posicionei de frente para o pequeno ecrã, vejo a cena. A tal que não me sai da cabeça.
Seis pessoas, dois homens e quatro mulheres, um incêndio que ameaçava as casas por ali. As chamas dançavam à frente deles os seis, nenhum era bombeiro. Tentavam, desesperadamente, vencer o fogo, disse o jornalista.
Os dois homens seguravam uma mangueira, a mesma mangueira, uma mangueira normal, das que se tem para regar o jardim.
As quatro mulheres carregavam baldes enormes daqueles de tinta, muitos litros lá cabem, muitos, e cheios de água, transportados por elas, cada uma com o seu, a verter água alguns, pelo caminho, uma escorregou, a outra ultrapassou-a, o fogo mesmo ali.
Um dos homens que seguravam a mangueira a apontar para o fogo, dava ordens às mulheres. Aqui, agora ali, mais para lá, deita mais aqui, olha aqui. E elas para cá, para lá, os baldes enormes, mesmo grandes, a água a saltar, a verter, elas a correr, escorregavam, continuavam, a água a lançar-se às chamas. Um e outro, quatro baldes à vez, depois oito, a mangueira a jorrar, muito bem segura por quatro mãos, mais para ali, mais para aqui e a cena mudou.
De volta ao estúdio e o pivot do jornal das oito retomou o ponto em que devia continuar. Parece que não viu a cena. Sobre a força silenciosa, obediente, das mulheres, nada disse, nada.
Talvez tenha perdoado aos homens, pelo horror da situação.
Eu acho boa ideia, perdoar.
Mas acho ainda melhor deixar aqui um abraço àquelas quatro mulheres, nunca mais as vou esquecer.
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