a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

10/11/2014

Uma ideia

- Outra vez às escuras?!

Não são poucas as vezes que oiço esta pergunta. E nestas não poucas vezes, encontro-me na copa de uma árvore, sentada, a baloiçar os pés e a pensar que sou um pássaro fugido de um quadro do Cruzeiro Seixas.

- Não estou às escuras, se estivesse não me tinhas visto aqui – respondo.

É que isto irrita-me. O facto de haver um interruptor de luz na parede não obriga o visitante a accioná-lo, isto deve estar escrito num lado qualquer, de certeza que está, e se não estiver está agora aqui, que também é válido.

A copa onde estou não é a da árvore, isso foi bug a meter-se connosco, e Cruzeiro Seixas apareceu porque é arte que não aprecio, tal como esta perguntazinha. Refiro-me, isso sim, à copa que dá para o refeitório onde costumo almoçar e que tem a máquina de café que uso duas ou três vezes por dia, depende de circunstâncias. Esta copa recebe luz natural que entra pelas enormes janelas da parede oposta do refeitório e recebeu logo na origem, aplicada no tecto, uma luminária de mau gosto e luz branca duvidosa do tipo câmara dos horrores que, uma vez acesa, confere um tom esverdeado aos rostos de quem ali está, não há maquiagem que nos valha, e distribui sombras fantasmagóricas por todo o lado. 

Eu acho que na pausa do trabalho as pessoas têm direito a um momento de repouso mental, um recolhimento à penumbra mais um menos sinuosa do pensamento, o que interessa isso, uma visita a memórias quentes, um refrescar de cansaços antigos, numa palavra, acolhedor.  

E isto enquanto a chávena acolhe o café que corre borbulhante, libertando o seu aroma insuperável de bom que é. Qualquer pessoa entende isto, mesmo as que não bebem café reconhecem-lhe a superioridade do aroma.

Dependendo do meu interlocutor, se é muito ou pouco de iniciativas, muito ou pouco observador ou muito ou pouco aberto a diferentes abordagens dos gestos habituais, posso ter de repente a luz acesa a queimar-me o cérebro como se estivesse há oito horas na sala de espera de um centro de saúde com cheiro a clorofórmio e muita ansiedade.

Portanto neste escorvar de semana, caso a qualidade da descrição acima não esteja ao nível do aroma do café, o que pode perfeitamente acontecer - arquitectos, por falar nisso, cadê vocês? - cá está mais uma fotografia. Imagem colhida este sábado num bar que de acolhedor tem tudo, se situa algures nos Países Baixos e que trago aqui hoje para desejar a todos não um bom natal, lá iremos, mas uma boa, e porque não acolhedora, semana. Voilá.


Acho que dá uma ideia.

E se uma não der, dão duas.

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