Fazer a aproximação a Lisboa pela A1 é uma experiência que me agudiza, me excita aos píncaros o desejo, até ao momento secreto, de me
tornar ministra da cultura, parece-me a cultura ser o pelouro mais
adequado, se é que há pelouro para isto.
O efeito do mau gosto holístico de que padecemos como povo
está patente em quase todo o lado, como se sabe. Está certo que a pala do
pavilhão de Portugal ali à beirinha do rio Tejo é coisa única, um orgulho, o
edifício do Tomás Taveira erguido na avenida de Berna a invocar a guitarra
portuguesa também, uma pena ter deixado de dar jeito falar no Tomás Taveira. Ah! E temos a ponte 25 de Abril. Não sei se me estou a esquecer de
alguma coisa, a Gulbenkian também conta, evidentemente, mas tirando os
monumentos manuelinos, barrocos e afins,
acho que está tudo. Isto no que respeita a Lisboa, claro.
Mas se de repente alguém ai não, não pode ser verdade, um
povo tão acolhedor, que simpático, afável, boa comida, sol e mar e tudo, mau gosto
não combina, se alguém assim, todo boa fé na gente, quisesse num ápice ver como
é, eu digo que é por aqui se faz favor. Por um ramal de acesso da A1,
direcção cidade branca, avançamos com muita atenção, podemos até levar a boa fé no colo, seguimos com cautela pela faixa da direita apesar de não haver por ali berma mas isso perdoa-se, pronto,
e depois preparemo-nos; a páginas tantas, o rodado segue ligeiro, ou pesado, para o efeito tanto faz, a páginas tantas, vamos lá, pimba na população infernal de cartazes
publicitários do tipo gigantones pernetas, cada um a querer ser mais alto que o
outro, nem consigo interromper este parágrafo tão lançada vou, cena patética a
saltar-nos para cima implorando que lá se ponha um anúncio, aqui! aqui!, alguns
descorados pelo sol, os que vêem sol, já estou a tentar travar, os números de
telefone que ostentam em font Arial tamanho (a partir de) um milhão quatro mil oitocentos
e trinta e cinco, eh pá não se aguenta. E o pimba nem precisei de o meter ali a
martelo, entrou que nem ginjas, caraças.
Mas há a internet, não há? há muitos sítios bons para
publicitar, p-u-b-l-i-c-i-t-a-r. O Youtube, por exemplo. Abrimos um
Beethovanzinho, um Chopinzinho, e pimba com uma coisa do Pingo Doce, segunda
feira é o robalo, abrimos o sítio do banco para pagar as contas e pimba com ideias
para créditos ao consumo, vamos ao dicionário ver uma palavra e levamos com os
ténis Adidas, abrimos o jornal para ler como vai o mundo e nem se consegue ver
nada com as frutas do Continente em promoção, mexem tanto que põem uma pessoa
tonta enquanto dura a procura da cruzinha rápido rápido para fechar aquilo. Mas
isto pronto, uma pessoa ainda vá.
Agora Lisboa tratada assim… receber-nos com uma floresta
patética de publicidade falhada, uns atrás dos outros, o mau gosto a reinar, pois dói. Dói e repito, excita-me aos píncaros o desejo de vir a ser a ministra certa.
Resta-me, portanto, começar a recolher assinaturas.
E depois?! Depois, já em casa, refiz-me. Arregacei as mangas e fui fazer um
jantar magnífico. Courgettes salteadas com maçã reineta não parece pois não?
Mas foi.
(só em itálicos, este post custou uma fortuna)
E a mim fez-me sorrir, ler o post, de tal forma visualizava à medida que [d]escrevias.
ResponderEliminarComo neste momento não me apetece reter as coisas que me incomodam - preciso de ir tranquila para o vale dos lençóis - detive-me nas courgettes salteadas com maçã reineta. Devem ser uma delícia!
Gosto de saber que sorriste, Maria. :-)
EliminarE sim, as courgettes com maçã, inventadas de repente, sairam mesmo bem.
Prepara a petição que eu assino logo!
ResponderEliminarEu sabia, Cuca, eu sabia que podia contar contigo! (vice-ministra e limpamos aquilo tudo?)
EliminarAcabei a rir com a parte final do texto. Deve ser por isto que se diz que o povo é sereno...lá vamos nós a irritar-nos com determinada situação e cresce aquele sentimento do temos que fazer qualquer coisa, temos de mudar isto...e depois, uma pessoa chega a casa, é preciso fazer o jantar, inventa qualquer coisa que afinal resulta e é bom e nos sabe tão bem e se calhar os cartazes não são assim tão maus :)).
ResponderEliminarBem captado, Cláudia. O que são quilómetros quadrados de poluição visual vertical se podemos chegar a casa e encontrar conforto ao fogão? :-)
EliminarAcabei a rir com a parte final do texto. Deve ser por isto que se diz que o povo é sereno...lá vamos nós a irritar-nos com determinada situação e cresce aquele sentimento do temos que fazer qualquer coisa, temos de mudar isto...e depois, uma pessoa chega a casa, é preciso fazer o jantar, inventa qualquer coisa que afinal resulta e é bom e nos sabe tão bem e se calhar os cartazes não são assim tão maus :)).
ResponderEliminarDesculpa o eco Susana, mas a primeira vez, apareceu a informação que tinha dado erro.
EliminarMas isso tem uma boa explicação, Cláudia: os teus comentários valem por dois. Ou mais.
EliminarVolta sempre. Com ou sem eco.