a voz à solta


Se leio, saio de mim e vou aonde me levam. Se escrevo, saio de mim e vou aonde quero.

29/05/2014

Pêndulo invertido

Não tendo eu a capacidade genética de ladrar, dei hoje de manhã os bons dias a um cão desconhecido.

Caminho pela rua e vejo à minha frente o pequeno cão branco dirigir-se a mim num trote ligeiro, o coto de pêlo que tem no lugar da cauda faz de pêndulo invertido muito rápido, com ângulos de cento e oitenta graus bem medidos, estou certa, e os seus olhos pretos pareceu-me que brilhavam. Estava preso a uma trela vermelha daquelas que esticam proporcionalmente ao entusiasmo do animal, veio aos meus pés entregar-me um ânimo canino que me tocou os sapatos e também o coração e eu oiço a minha voz dizer-lhe bom dia!, creio que a sorrir.

A mulher que o acompanhava também ouviu, fez uma espécie de careta e, percebendo que a saudação não se dirigia a ela, não me respondeu. Percebeu bem.

Aquele momento, ao tocar-me o coração, aqueceu-me a alma, confesso, ainda que sob admiração.

E foi o que me valeu até ao meio dia.

Hora em que, sucumbindo ao frio, liguei, no meu local de trabalho, o aquecimento no máximo.

Devo estar doente. Ou então não estamos quase em junho.

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